Pe Osnildo Carlos Klann, scj

Desde 2007, o padre Osnildo realiza sua missão dehoniana na República Democrática do Congo e, através de reflexões, notícias e informações, partilha suas experiências missionárias.

Para entrar em contato, escreva para ocklann@yahoo.com.br

segunda-feira, 16 de abril de 2007

Edição 02



Centro de formação D. Grison
Começo com informação sobre nosso Centro de Formação. Na verdade, é um centro muito procurado. Acolhe muita gente, embora suas acomodações não sejam muito boas. A ocupação do Centro não acontece só em fins de semana, mas também durante toda a semana. Pode acolher até 80 pessoas, de forma precária.
É preciso, antes de tudo, melhorar os espaços físicos. Atualmente o Centro oferece pouco conforto, nos quartos, nas salas de conferência, cozinha, refeitório, capela e outros lugares de encontros. Graças a Deus, a província congolesa está investindo bastante, construindo muitas novas alas, para substituir os antigos e pouco higiênicos ambientes que temos, agora.
Os trabalhos de construção se desenrolam lentamente. Um grande número de operários executa a obra. Mas ainda de modo primitivo. Para escavar a terra ainda é com picareta, pá e para carregar, o carrinho de mão. Estava observando: uma pequena elevação que era preciso tirar e que um trator faria em meia hora, se tanto, há alguns dias, dezenas de operários trabalham e não terminaram ainda.
OS operários trabalham das 7h30m até às 14h30m. Depois vão embora. Geralmente ficam sentados à frente da casa, batendo papo. Muitos se encontram debaixo de uma árvore ou debaixo de bambus à beira do caminho tomando seus traguinhos.

Os pequenos negócios
Como há muita falta de emprego, porque não existe indústria, cada um vira-se como pode. (EM Kisangani, há 80% ou mais de desempregados) Por isso, os inúmeros pequenos negócios ao longo dos caminhos, em feiras improvisadas com barraquinhas de bambu ou mesmo com as mercadorias expostas no chão ao lado de água estagnada,poeira e outros detritos mais. A maioria absoluta das pessoas que vendem, negociam são mulheres. São elas também que levam sobre a cabeça os mais diferentes objetos, desde lenha até folhas de aipim, muchicha, ou mesmo a raiz de aipim. Não vi até agora, nenhum homem carregar na cabeça mercadorias.
Ao lado do carvão, no chão, tomates pequenos; mais além, peixe seco, bem torrado, preto, em abundância; óleo de palmeira, maços de cigarro, com um ou alguns cigarros dentro para a venda; algumas peças de roupa, para crianças. Muita lenha; gasolina, vendida em garrafas. Os produtos mais em evidência: lenha, carvão, peixe, mandioca (folha ou raiz) e também material de construção, isto é, bambu, para fazer a estrutura da casa e palha, para cobrir. Os bambus são revestidos de barro.


Toleka
Uma coisa muito original são as bicicletas-táxi. Como existem poucos carros (somente autoridades, a ONU- soldados da ONU estão em todas as partes - , padres, religiosas, alguns negociantes possuem carros.), o meio de transporte é a bicicleta e a moto, que servem de táxi. Dois pequenos ônibus fazem também o transporte de pessoas para o nosso bairro do SIMISIMI.
No entanto, penso que a maioria das pessoas, por não ter dinheiro nem para o toleka nem para o ônibus vai e vem a pé. As ruas de Kisangani parecem um formigueiro de tanta gente andando para cá e para lá. O povo não fica em casa. Vai para as ruas caminhar.

As casas
Como já informei, grande parte das casas são de bambu com barro. No centro da cidade, as casas são de material, do tempo dos belgas, mas mal conservadas: sem pintura, telhado caindo, janelas fechadas com panos ou mesmo bambu, reboco em péssimo estado; no telhado, muitas vezes, capim crescendo. O problema é que não existe aqui muito material para reformar e se existe, o preço é alto demais para as condições dessa gente. Por isso, vão deixando as casas se deteriorarem sem se preocupar com as reformas. Ficam lá até que for possível. Imaginem uma casa de 40 ou mais anos sem nenhuma reforma....
Aliás, a casa é apenas para dormir. As outras coisas fazem tudo fora. Às vezes à tarde, faço um passeio de moto para treinar. Vejo o pessoal na frente da casa, sentado, conversando, e as crianças brincando, na rua, pois na casa mesmo não há lugar para se ficar. Só para dormir. Agora estão surgindo já algumas casas de material e algumas residências bonitas. Penso que a mentalidade está mudando.

As ruas
As ruas de Kisangani são lamentáveis. Hà anos ou talvez mesmo nunca viram um trator, uma patrola. Aliás, não vi nenhum trator, na cidade. Ah! Se o Renato Zucco estivesse por aqui! Não há nenhuma rua boa, sem buraco. Vi como arrumam as ruas no centro, onde há asfalto em péssimo estado : nos buracos colocam terra. Só.

Nosso menu
Nossa cozinha não prima pelo asseio. O fogão é triste de se ver. Penso que seja um dos primeiros daqui. Como estão acostumados a cozinhar fora, também aqui, algumas comidas maman Francisca faz fora. O cardápio é pouco variado: arroz, todo dia; feijão, às vezes; sombe (folha de apim), diariamente, (a raiz de aipim ainda não comi aqui, a não ser no lituma- isto é, banana e aipim amassados juntos) ; faz parte do menu também o fufu (pirão de mandioca e polenta); carne de gado, raramente; galinha e fígado constantemente. Mas a galinha vem quase torrada Peixe não falta. De uns tempos para cá, como sabem que eu gosto bastante, está vindo sopa, bem feita, e espagueti. Vem também muchicha, uma leguminosa, boa, por sinal. Não falta o molho. Faz parte também do cardápio, banana frita. Uma banana especial, grande e dura. Para tomar, água em abundância, e também refrigerantes, água tônica, que me faz muito bem, por causa da malária. Quem desejar também pode tomar cerveja.Há só uma marca : Primus. Não todo dia, naturalmente. Também tem vindo, algumas vezes, couve. Como sobremesa, há sempre banana, abacate, muitas vezes abacaxi, e freqüentemente, salada de frutas, que eles chamam de “macédonie”. É claro que a maneira de preparar esses alimentos não é sempre como no Brasil. Mas não posso me queixar da alimentação.
De manhã, café, leite em pó, pão, margarina, queijo, ovos cozidos às vezes, geléia. Açúcar mascavo. O pão é comprado uma vez na semana.É mantido na geladeira. E mesmo assim é bom!!! Na verdade não posso me queixar da comida. Estou comendo bem. Nem emagreci, como queria! À noite, nós esquentamos a comida que sobrou ao meio-dia.
Esse cardápio não é do povo em geral. Em outra oportunidade vou informar-lhes como comem os nossos irmãos congoleses.
Nossa cozinheira, Maman Francisca vem sempre bem vestida. Parece que vai para uma festa. Vestido longo. Cada dia um pagne diferente, fartamente colorido. Por cima, coloca um avental azul e assim ela trabalha. Aos domingos é o Paul que faz nossa comida. Ele cozinha bem também.


Maman e papá
Os homens são chamados de “papá ” e as mulheres de “maman”. No começo, pensei que se tratasse realmente do pai ou da mãe de algum padre daqui. Por fim, conclui que todo mundo aqui é “papá ” e “maman”. As mulheres sempre de vestido longo e por cima o pagne ( um tecido que elas envolvem aos rins e vai até o calcanhar). E os homens sempre de calça comprida. Até hoje não vi homem de bermuda nem de calção, apesar do calor. Nem se pode imaginar aqui o padre de bermuda!
Desculpe pela longa reportagem. Há outras informações ainda que vou enviar-lhes. Não quero cansá-los nem aborrecê-los com tantas palavras! Apesar de tudo, é preciso sublinhar que o povo congolês é um povo que sofre, sim, mas não vive triste.É um povo que canta e dança. Alguém me perguntou dias atrás, através de e-mail, a respeito de um artigo saído numa revista brasileira sobre os feiticeiros e feiticeiras daqui. Infelizmente essa é a realidade. Não é fácil mudar alguns anti-valores de certas culturas.
P. Osnildo Klann

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