Pe Osnildo Carlos Klann, scj

Desde 2007, o padre Osnildo realiza sua missão dehoniana na República Democrática do Congo e, através de reflexões, notícias e informações, partilha suas experiências missionárias.

Para entrar em contato, escreva para ocklann@yahoo.com.br

domingo, 1 de junho de 2008

Quase quebrei o nariz...

Dia 17 de maio, o diácono Richard e eu continuamos as visitas ás capelas. Hoje foi a capela de São Rafael, no bairro Batiambobi, do outro lado do rio. A travessia de 40 minutos foi tranquila. Mas o desembarque foi desastroso. A beach (chamam de beach o local do embarque e desembarque das pessoas) era muito ruim. O terreno molhado, inclinado, sem nenhuma árvore ou galho ou qualquer outra coisa para a gente se segurar. Eu, com um pé na piroga e outro na terra, sem ter em que me apoiar, dei o impulso para sair do barco e escorreguei com a perna de apoio e lá fui eu de nariz contra a canoa. Graças a Deus, nem os óculos sofreram nada. Nem quebrei o nariz, o que poderia ter acontecido muito bem, pois o tombo foi feio.

Breve caminhada pelo mato e chegamos à aldeia. Como todas elas aqui: pobreza extrema, ranchos de bambu e de argila. Assim também é a capela. Pouca gente na missa. Mas cantam muito e muito alto. Como sempre, há alguns garotinhos (as) que dão o espetáculo da dança. Bonito.

Depois da missa, fomos à casa do catequista para uma breve reunião. Reclamam que não têm mais enfermeira para o dispensário, pois os responsáveis da Rive Gauche não permitem mais que sua enfermeira vá cuidar dos doentes de Batiambobi, porque algumas pessoas do bairro a maltratavam. Não sei como, mas essa é a queixa da enfermeira.
Depois da reunião, ali mesmo, o almoço. Cardápio, como sempre: arroz, em grande quantidade, sombe e alguns pedaços de galinha. Para mim, havia um prato de louça, com uma colher. O diácono recebeu um prato de alumínio, com uma colher também; os três outros homens que lá estavam comeram na tampa das caçarolas. Dois outros senhores ficaram olhando. Não sei se comeram depois de nossa saída. As mulheres aparecem para servir e para se despedir. Somem. O que me chamou a atenção foi o apetite desses senhores. Comem bem e com gosto.
Sombe (folha de aipim), que faz parte obrigatória do cardápio desses nossos irmãos, é um alimento muito rico. Por isso, creio, o pessoal daqui, mesmo comendo pouco, tem um aspecto bonito e não dão a impressão de passar fome. O segredo está nessas folhas e em outros legumes que comem.

A volta foi por outro beach. Caminhamos mais de meia hora até chegar lá. Foi mais fácil embarcar. Como os reis magos, fomos por um caminho e voltamos por outro!


Minha prece numa tarde de domingo

Partimos às 8h,30 m de casa, os dois missionários: diácono Richard e eu. Na moto. Ele na direção; eu na garupa. Percorridos os nove quilômetros que nos separam das margens do Rio Lindi, do qual não tenho boas recordações, contratamos uma piroga (canoa): 2.000 francos congoleses (+ou- 3 dólares americanos). Embarcamos: a moto, os dois missionários, mais dois passageiros e os dois remadores. Recordando o tombo na água, nesse mesmo rio, veio-me um certo receio, pois a canoa pendia para um lado, por causa da moto e dos outros dois passageiros. Graças a Deus, a viagem terminou bem.

Chegamos no outro lado e devíamos percorrer mais 8 quilômetros até a capela de Santo Agostinho em Yaongonda. Devíamos, mas a moto não quis. Emperrou como um burro teimoso. Não houve quem a fizesse funcionar. O jeito foi esperar a chegada do P. José, pároco interino de São Gabriel que iria visitar uma outra capela na mesma direção. Fui com ele e meu colega de missão teve de voltar para casa, com a moto em “pane”.

Naturalmente, cheguei com pequeno atraso. Mas como aqui o tempo não tem grande importância, o atraso não significou nada. Como o diácono não veio comigo, tive de fazer a homilia. Mas, a meu lado havia um tradutor, pois pouca gente naquele bairro conhece o francês. Deu tudo certo. A capela é pequena, pobre, mas um pouco melhor que as outras que já visitei. Como em todas elas, cantam com todo o fôlego, com entusiasmo.

Após a missa, fizemos uma rápida reunião com os responsáveis da capela. Seu projeto: querem fazer uma plantação de amendoim, de milho e de outros produtos, para obter algum dinheiro para comprar alguns bancos para a capela, pois os fiéis não têm dinheiro. O problema é que não tem dinheiro nem para comprar as sementes. Vamos estudar o caso com o pároco.
Apos a reunião, o almoço. Cardápio bem frugal: lituma (banana amassada) com carne de galinha no molho.

Fiquei conversando com o pessoal que me perguntava de tudo sobre o Brasil. Eles têm muita curiosidade a respeito de nosso país. A conversa esticou, esticou e o padre José não vinha mais me pegar para voltar para a casa. Depois de varias tentativas, consegui me comunicar com ele. Explicou-me, então, que havia um grave problema naquela capela por causa do diretor da escola católica que havia ficado com o dinheiro do salário dos professores. Junto com o P. José tinha ido um senhor, membro do conselho de educação das escolas católicas da região de Kisangani, que reuniu a comunidade para ouvir e fazer um relatório dos fatos ao responsável das escolas católicas. Por isso, a demora.

Partimos de lá pelas 16 horas. Ao chegar no beach, tive uma sorte imensa: o ferry boat, há pouco inaugurado, estava de partida para o outro lado. Aproveitei a carona, mas meu colega teve de voltar para pegar o senhor que tinha vindo com ele.

O ferry boat faz a travessia somente quando aparece algum carro. O preço é demais: para atravessar os 300 metros, mais ou menos da largura do rio, cobram 15 litros de combustível (cada litro custa aproximadamente 1,60 dólar americano). Para a nossa realidade aqui é um preço exorbitante. Quando aparece um carro disposto a pagar esse preço, os pedestres aproveitam, pois não pagam nada.

Após essa série de contratempos desse domingo, voltei para casa, descansei um pouco, pois estava cansado mesmo e depois fui fazer minha prece. Agradeci o Senhor por ter terminado tudo bem nesse domingo. Apesar do problema da moto, dos atrasos, da espera, do medo da travessia, apesar de tudo isso, pude transmitir um pouco de alegria e paz àquela gente.
Rezei também por eles, pois vi, mais uma vez, a aflição desse povo. Sempre a mesma queixa: não ganham nada; passam fome, não têm o que fazer, não vêem esperança nesse país.
Que Deus olhe por esse povo sofredor e desperte as consciências de seus dirigentes e responsáveis para dar-lhe condições de vida digna, de paz e prosperidade.
Foi minha prece nessa tarde de domingo!

Kisangani, 19 de maio de 2008
P. Osnildo Klann

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