Pe Osnildo Carlos Klann, scj

Desde 2007, o padre Osnildo realiza sua missão dehoniana na República Democrática do Congo e, através de reflexões, notícias e informações, partilha suas experiências missionárias.

Para entrar em contato, escreva para ocklann@yahoo.com.br

domingo, 21 de dezembro de 2008

A difícil busca da paz

A delegação do governo congolês e os representantes do CNDP (Congresso nacional da defesa do povo) do revolucionário Nkunda, reunidos em Nairobi, Quênia, ainda não chegaram a um acordo para a assinatura do cessar-fogo, no leste congolês. A cerimônia da assinatura estava prevista para quinta-feira passada. Os representantes do CNDP entraram com nova exigência: querem a presença, na reunião, dos presidentes da duas Casas do Congresso congolês e os presidentes dos partidos do governo e da oposição. Os representantes do governo congolês nâo aceitaram essa condição. A assinatura foi então adiada para sexta-feira, dia 19. Diante das divergências das duas partes, o mediador das conversações, o ex-presidente da Nigéria, Olusegum Obasanjo se propõe impor o cessar-fogo, segundo as informações da Radio Okapi. Sem nenhum resultado positivo as conversações continuaram sábado e domingo, dia 21 de dezembro.

Nesse domingo, a reunião de Nairobi, Quênia, terminou melancolicamente. Pelo jeito os revolucionários de Nkunda não querem mesmo a paz. Querem a guerra. Os argumentos que agora apontam para não assinar o acordo são falsos, segundo o mediador do conflito. Acusam o exercito congolês de atacar suas posições. O que não corresponde à verdade.. A própria MONUC ( Missão da ONU no Congo) constatou “in loco” que nenhum ataque foi desferido pelo exercito congolês contra as posições de Nkunda.

Somente os representantes do governo congolês assinaram os termos de cessar-fogo. E esse gesto unilateral revela a “boa vontade” do governo congolês de estabelecer a paz.

Os representantes dos dois lados concordaram em continuar as conversações a partir do dia 7 de janeiro de 2009. Mais um tempo de esperança. A continuação desse frágil cessar-fogo unilateral objetiva facilitar o encaminhamento de ajuda humanitária aos flagelados da guerra e pode ajudar também a continuação do diálogo entre as partes, em clima mais tranquilo, segundo os observadores.

A impressão que se tem é que realmente não existe nenhuma boa vontade em terminar essa guerra. Essa impressão inicial continua, apesar do teatro que fazem as partes beligerantes e as forças ocultas que estão atrás de tudo isso. Por que isso? E o povo sofre.

P. Osnildo Carlos Klann, scj

Kisangani, 21 de dezembro de 2008

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

As "guerras" do Congo

A guerra no leste congolês patina. As conversações de Nairobi, Kenia, entre a delegação governamental e os representantes do CNDP (Congresso nacional de defesa do povo) vão recomeçar a partir do dia 17 de dezembro, apos um primeiro round que, segundo o mediador do dialogo, ex-presidente da Nigéria, Olusegun Obasanjo, foram positivas e já se caminha, um pouco, na direção da paz.
Mas há profundas divergências. A Onu acaba de declarar que Ruana está dando apoio multiforme ao general Nkunda. Mas acusa também a RD do Congo de apoiar outros revolucionários que, a partir do território congolês, combatem o regime de Ruanda, como a FDLR( Forças democráticas para a libertação de Ruanda) e Pareco ( Patriotas resistentes congoleses).
Ruanda não aceita as declarações dos enviados especiais, experts da Onu, a respeito de seu apoio aos revolucionários de Nkunda. Acusa, pelo contrario, a RD do Congo de apoiar milicianos e grupos revolucionários que combatem o regime dos tutsis, em Ruanda, como as FDLR e os Pareco.

Além dos três grupos armados citados acima, há ainda um quarto, que combate e tenta derrubar o governo de Sudão. É o LRA ( Exército de resistência do Senhor). Eles se escondem no nordeste congolês, para invadir o Sudão. Mas estando em terras congolesas, perturbam também os congoleses.

Uma ação conjunta dos militares ugandeses, sudaneses e congoleses conseguiu, domingo passado, desbaratar a principal base do LRA, destruindo seu acampamento principal de Koni, na RD do Congo. Essas operações militares vão continuar até acabar com todos os acampamentos desse grupo revolucionário. A população de Dungu, na Província Oriental de Kisangani, deseja que isso aconteça ainda antes das festas de fim de ano. Além disso, estão preocupados com o que vai acontecer com as crianças e adolescentes recrutados por esse grupo, como soldados.

Como podem observar, as frentes de luta no leste congolês são várias e com grupos armados atemorizando e mesmo escravizando a população, como acontece agora mesmo com os Mai-Mai que, perto de Butembo, mantém a população sob domínio de força.

Esperemos que em Nairobi, os representantes do governo congolês e os enviados de Nkunda cheguem a um acordo e selem a paz. Que o espírito de paz natalino possa inspirar esses homens para abrirem um caminho de paz e prosperidade no leste congolês!

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Capela São Rafael

Mais um domingo cheio. Missa na capela São Rafael,bairro Batiambombi. Do outro lado do Rio.
Viagem de canoa; 30 minutos até o outro lado. Depois uma caminhada de 45 minutos pelas trilhas do mato. Kolomai, o “piroguier”, na frente, com seu andar defeituoso, uma perna bem mais curta do que a outra. Mas caminha firme, levando minha maleta e a cadeirinha de vime, onde a gente se senta na canoa. Se tem pernas defeituosas, possui, em compensação, braços vigorosos; rema com segurança e é considerado o "mestre das águas" ( 'E o significado de seu nome, Kolomai). De quando em vez, cruzávamos com algumas pessoas. Passamos por três aldeias. Todas pobres. As mesmas casas de sempre: bambu e barro. Os crentes estão presentes também nesses longínquos recantos. Suas igrejas são como as nossas, de bambu, e algumas vezes, bambus cobertos de argila. E o que mais se vê, são crianças sujas, maltrapilhas, mas sempre com uma carinha muito simpática.
Durante a caminhada, de ida e volta, pelo mato, tive tempo bastante para refletir. Lembrei-me que daqui dessas terras africanas, partiram levas e levas de escravos, séculos passados, para o trabalho escravo de nossa pátria. Que sofrimento dessa gente, longe da pátria, dos entes queridos, de suas tradições, obrigados a viver em outra cultura, em outra religião! A presença missionária brasileira, na África, certamente tem um singelo sentido de reparação desse pecado de nossos antepassados. Essa divida do Brasil para com a África é muito grande e é preciso reparar esse mal.
Passando pelas aldeias, tive a impressão de estar voltando aos séculos XVIII ou XIX. Penso que de lá para cá pouca coisa mudou nesses recantos. Talvez até tenha piorado. E se pergunta: vai ainda mudar?
A volta levou 1h45m. Subindo o rio Congo, lentamente.
Mais um domingo, com muito cansaço, sem comer, pagando para trabalhar, mas contente da vida, pois ajudamos o próximo!

P. Osnildo Carlos Klann, scj
Dezembro de 2008.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Solidariedade

Prezados(as) amigos(amigas), tenho acompanhado com muita tristeza as trágicas notícias das enchentes, deslizamentos, mortes, destruições em Santa Catarinha, por causa das grandes chuvas que estão castigando nosso Estado. Mesmo de longe, quero fazer-me bem perto de todos aqueles que foram atingidos por essa calamidade, num fraterno gesto de solidariedade cristã. Além disso, posso garantir-lhes minhas preces ao Senhor da vida para que proteja a todos e suscite generosidade e caridade em todos aqueles que podem e devem ir em socorro dos irmãos ncessitados.
Fraternalmente, P. Osnildo

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Muchapa

Meus amigos (as), estive fora do ar, alguns dias, por causa de problemas técnicos. Estou de volta. Envio-lhe uma curta crônica de meu domingo. São as coisas simples que acontecem aqui conosco. Não temos grandes feitos. Apenas as coisas miúdas de cada dia. Em relação à guerra, tudo está em banho- maria. Tenho a impressão que não há interesse em terminar com essa guerra. Um jornal lá do leste que sai uma vez por mês, critica a ONU dizendo que ela não está interessada em acabar com essa guerra. Não sei se essa opinião é válida, mas na realidade, as coisas não evoluem. Obrigado pela sua atenção e amizade.

Muchapa
Como sempre, o “piroguier” chegou com uma hora de atraso. Já estava impaciente, pensando que não viria mais, como aconteceu no primeiro domingo deste mês. Prometeram e não vieram me buscar.
Muchapa é o nome do bairro. O nome é homenagem ao antigo chefe daquele povoado. O patrono da capela é Santo Afonso. Capela e lugarejo paupérrimo. Pouca gente na missa. Mas cantam que é uma beleza. Resultado da coleta: 540 francos congoleses. Nem um dólar. Gastei 3 dólares para atravessar o rio.
Após a missa, fizeram uma partida de futebol em minha homenagem.. Levei a bola. Poucos minutos apenas. O campo, em péssimas condições, chamam de estádio. Entre um tempo e outro, fui almoçar. Um pouco de arroz com um pedacinho de peixe defumado. Ganhei um ovo de galinha. Pedi para cozinhar. Misturei com o arroz. Estava muito gostoso, apesar de tudo frio.
O bairro fica do outro lado do Rio Congo, na margem esquerda. A uns 4 quilômetros daqui. Para ir, 45 minutos; para voltar, rio acima, 1 hora e meia. Na ida fui sozinho na piroga ( canoa). Era grande. Viagem calma. Na volta, viria também sozinho numa grande piroga, quando, na hora da partida, apareceu uma outra piroga, imensa, já cheia de passageiros, sentados no chão da canoa, homens, mulheres, crianças e mais uma carga imensa de cestas enormes com mandioca, folha de aipim, carvão etc. Ela estava indo também para o outro lado do rio, na região do mercado Spirro, perto de nossa igreja. Para não viajar com duas canoas, me colocaram no último lugarzinho que sobrava da canoa que estava partindo. Sentado numa cadeirinha de palha, lá fui eu, com muito medo, naquela imensa canoa, cheia de passageiros e de carga. Viagem lenta, pois era preciso subir o rio. Sobe-se pela margem esquerda, sempre bem perto da costa. Dois remadores: um na frente outro atrás. Vigorosos jovens. O de trás empurra a canoa; o da frente dirige, evitando que a canoa bata nas margens do rio. Enquanto se navega pela costa, é agradável, porque sempre à sombra dos arbustos e árvores. A certa altura da viagem, começam a atravessar o rio. A correnteza é forte e nos arrasta. Os remadores fazem esforço redobrado e ritmado para controlar a embarcação. Num momento de pausa, no remo, o jovem da frente refresca seu rosto na água do rio; lava-se; tira o abundante suor que lhe escorre pela face e sem nenhum constrangimento ou medo toma abundantes goles de água do rio, que não é tão limpo assim. E para surpresa minha, repete a cena quando já estamos bem perto da outra margem, onde a água é bem poluída. Lembrei-me, então, de um fato ocorrido com um velho missionário belga, de 87 anos, que ainda vive, P. Mondry. Ele viajava com o P. Dino Ruaro, no interior da RD do Congo, quando aqui ainda havia algumas estradas. A certa altura, P. Mondry pediu para parar o carro, à beira de um riacho. Desceu, foi ao riacho e bebeu da água suja. P. Dino, atônito, lhe perguntou: - Padre, não tem medo de beber dessa água? Ah! - respondeu o velho missionário - bebi água limpa e me fez mal; bebo da água suja e não me faz mal!
Cansado, mas muito contente, voltei para meu quarto. Mais um dia de missão. Não ganhei nada materialmente, mas senti-me feliz em poder dar algum conforto espiritual e alegria àquela pobre gente!
Mais feliz ainda fiquei quando, hoje, segunda-feira, enquanto estou aqui, em meu escritório, escrevendo essa crônica, recebo a visita do chefe da capela de Muchapa e de um garotinho de lá, perguntando como foi minha viagem de volta. Em geral, eles entram aqui, somente para pedir algo. E os dois vieram perguntar como foi minha viagem de volta! Que bonito!

P. Osnildo Carlos Klann, scj
Kisangani, 17 de novembro de 2008

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Estação das chuvas


Estamos na estação das chuvas. Aqui, como no Norte e Nordeste brasileiros, há apenas duas estações: a estação seca e a estação das chuvas. Kisangani para, quando chove. Os negócios não abrem, porque não há compradores. Os trabalhadores não vão ao trabalho, porque não têm como enfrentar a chuva. O mercado central e as vendas em cima das calçadas desaparecem. A energia elétrica é cortada. Portanto não se pode trabalhar com aparelhos elétricos nem eletrônicos, como por exemplo, fábrica de móveis, serraria, fábrica de bebida.... ( Estou escrevendo essa crônica, em meu laptop com bateria). As crianças não vão á escola, porque não têm guarda-chuva. Com chuva, tudo para aqui.

Para dizer a verdade nua e crua, a RD do Congo é um pais em falência. Certamente as guerras e a corrupção levaram a isso. Não temos estradas. Meios de transporte precaríssimos. Além da falta de estradas, outro setor em falência é a educação. Professores mal pagos; alunos impossibilitados de pagar a “prime” (mensalidade), prédios em lamentável estado de conservação, alunos das escolas publicas sem livros e muitas vezes, sem cadernos; salas de aula, sem quadro negro, sem giz, sem bancos... tudo isso revela o estado de degradação a que chegou a educação nesse país.

Nem vou falar de novo, da saúde, da higiene publica, das moradias, das ruas das cidades...
Com a guerra no leste, os preços dos alimentos e de outros produtos foram para as estrelas. Um saco de cimento, que no leste custa aproximadamente 15 U$ ( quinze dólares), e no pais vizinho, Rwanda, 6 U$ (seis dólares); aqui em Kisangani, custa 50 U$ (cinqüenta dólares). Nós estamos aumentando o centro D. Grison. Como poderemos continuar a construir com esses preços? Um saco de feijâo custa “apenas” 170 U$ (cento e setenta dólares).Deveria ser o alimento dos pobres!!!

E a guerra no leste continua. Noticias diárias dão conta que as populações daquela região vivem ainda o drama dos saques, das mortes, das perseguições, dos tiroteios. Os revolucionários, um reduzido número de militantes, fazem a guerra das guerrilhas. O exército congolês é impotente para deter o avanço dos comandados de Nkunda; a Monuc ( Missão da Onu no Congo) também não consegue proteger toda a população. O grupo Pareco ( Patriotas resistentes congoleses) entra também na guerra para defender a população, mas não resiste igualmente. Enquanto isso, os grandes se reúnem em discussões intermináveis, com vultosos gastos de viagem, hotel, diárias, e não chegam a nenhuma conclusão. Os dois presidentes de Rwanda e da RD do Congo, há dias, se reuniram em Nairobi ( Quênia), para tratar do assunto da guerra; até agora, apesar de ter procurado, todos os dias, noticias da reunião, não encontrei nada. Não sei o que aconteceu nessa reunião; ou se aconteceu algo de importante. Tem-se a impressão que eles não querem acabar com a guerra. Há muitos interesses econômicos atrás de tudo isso.

Domingo ultimo, o Papa, no Angelus do meio-dia, fez um veemente apelo pela paz na RD do Congo, manifestando sua preocupação pelas numerosas vitimas desses sangrentos confrontos, e denunciando as sistemáticas atrocidades cometidas contra a inocente população civil do leste congolês. Segundo o Papa, mais de um milhão e meio de refugiados já tiveram de abandonar suas casas, vivendo agora em situação precaríssima, segundo o testemunho do enviado da Onu, para a manutenção da paz.

A Igreja está seriamente empenhada em ajudar os refugiados,especialmente a Caritas espanhola, Caritas congolesa e a Caritas internacional.
Também as congregações religiosas estão sensibilizadas e desejam colaborar na ajuda humanitária às populações do leste congolês. Em conversa, via skype, com o P. Cláudio Weber, conselheiro geral de nossa Congregação, domingo passado, soube que P. Ornelas, nosso superior geral, ,convocou uma reunião,para essa quarta-feira, com todos os superiores gerais de Roma, que possuem religiosos trabalhando na África, para tratar do trágico problema congolês. É evidente que não poderão terminar com a guerra. Mas vão manifestar e oferecer sua solidariedade ao sofrido povo do leste congolês e chamar, mais uma vez, a atenção dos responsáveis, para desenvolverem reais esforços em busca de uma solução diplomática, estável, para essa guerra.

Que venha a paz para a nossa nação!

Apesar de todos esses problemas, vale a pena estar e trabalhar aqui. Não se pode resolver todos os problemas. Mas ao menos pode-se colocar uma gota d´água na fervura dessa geral situação de sofrimento.

Kisangani, 11 de novembro de2 008
P. Osnildo Carlos Klann, scj

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Trégua no leste congolês

Meus amigos, a situação hoje, dia 2 de novembro, está mais calma no leste congolês. A pressão internacional deteve a marcha de Nkunda. Mas ele está ainda nos arredores da cidade de Goma. Os emissários dos EUA, da União Européia, da ONU, da Grã Bretanha, fizeram apelos e forte pressão pela paz e conseguiram um cessar-fogo, enquanto Alan Doss, representante especial do secretário geral das Nações Unidas, pede às tropas da ONU e à população de Goma para colaborem com a segurança da cidade. Foi decretado, hoje, o toque de recolher.

As autoridades mundiais envolvidas no processo diplomático para a restauração da paz na região, conseguiram convencer os dois presidentes de Rwanda (Kagame) e da RD do Congo (Kabila) para se reunirem e tratarem diretamente do assunto da guerra, pois o conflito envolve diretamente esses dois países, embora Rwanda negue.

Mas, enquanto de um lado, se procura a paz, em outro ponto, mais ao norte de Kivu Norte, um outro grupo revolucionário aterroriza a população com massacres, mortes, violências, pilhagem. É o grupo LRA (siga inglesa: Lord´s Resistance Army). São ugandenses que também invadem o território congolês e atemorizam a população.

Outro grupo perigoso da região são os Mai-Mai. São cangaceiros; bandidos, que matam, roubam, violentam ...
Como veem, não será fácil trazer a paz para esse país.

Kisangani, 2 de novembro de 2008.
P. Osnildo Carlos Klann, scj

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Nkunda em Goma

Depois de ler a mensagem que me veio da Embaixada brasileira na RD do Congo, tentei telefonar para outro brasileiro, P. Vilson Hobold. Infelizmente, notei que não tinha mais créditos ( unités) em meu celular. Peguei, então, minha pequena mobilete e me pus a caminho.
As coisas pareciam diferentes, no percurso que fiz de uns cinco quilômetros. Olhava com atenção os buracos da estrada, para não cair neles, mas minha atenção estava voltada para outro lado. As pessoas me pareciam estranhas... Como sempre circulavam em grande numero pela estrada, ou em tolekas (bicicletas-taxi) ou a pé ou de moto ou, poucos, de carro. Tinha a impressão que todos viviam o mesmo momento de preocupação que eu, e corriam depressa para as suas casas, procurando segurança..

Pela primeira vez, em minha vida, me senti dessa maneira. Sensação estranha, num país estranho. O pensamento voava longe e tentava responder: como fazer se, de fato, o previsto pela embaixada acontecesse? Aonde ir? Onde esconder as coisas mais necessárias? Como ajudar o povo? Qual seria minha reação diante de uma realidade assim?

Nesse ínterim, cheguei à casa do provincialado, perto do centro da cidade. Encontrei o P. Vilson. Li para ele a mensagem. Ele me tranquilizou. É preciso guardar a calma e esperar o desenrolar dos acontecimentos. Telefonamos para outro brasileiro, P. Mateus, que estava de aniversário naquele dia. Depois de parabenizá-lo, li para ele a mensagem da embaixada: “Devido os recentes acontecimentos no leste da RD do Congo, o Ex.mo Sr. Embaixador do Brasil recomenda que ultimem estoques de alimentos e preventivamente arrumem suas malas conforme recomendado pela equipe de segurança” . Do outro lado da linha, o aniversariante só deu uma gostosa gargalhada e disse: “nós já estamos acostumados a essas cosias! Não se preocupe!”

Esse diálogo me tranquilizou; as notícias que acabava de receber do leste congolês eram alarmantes: os revolucionários tinham entrado já na cidade de Goma e a população estava fugindo em massa.

Dia seguinte veio outra noticia: o general revolucionário Nkunda não entrou ainda na cidade de Goma, importante centro comercial do leste congolês. Está a uns quinze quilômetros distante, mas o exército congolês, como sempre, já se pôs em fuga, ficando só as tropas da ONU na cidade para defender quem lá ficasse. Infelizmente o exército da ONU é pequeno para conter o avanço das tropas revolucionárias.

Enquanto isso, os grandes desse mundo se reúnem na ONU, em Nova Yorque, para discutir o que fazer. Como tem muitos interesses em jogo, não tomam decisão urgente para ajudar o povo. Vão fazer nova reunião, penso, amanhã, para não resolver, de novo, nada. E o povo continua fugindo, perdendo tudo, sendo violentado, espoliado, deixando pelos caminhos por onde passa, com seus míseros pertences, a esperança de dias melhores, de paz e de prosperidade que os políticos sempre prometem em tempos de eleições.

Não posso compreender como as nações fiquem indiferentes diante dessa tragédia humana. Se fosse para proteger a vida de algumas focas ou alguns animais haveria uma movimentação intensa de todas as partes, para salvá-los (o que seria justo). Mas para salvar milhões de vidas humanas não se tem muita pressa.. E se fica indiferente.

Não consigo entender também como é possível que a estúpida ganância de poder de um general tutsi se impõe tão descaradamente diante das autoridades do mundo inteiro, desafiando-as. Certamente atrás desse general que recebe ajuda exterior, há muito interesse mesquinho, talvez de grandes nações. A RD do Congo não cessa de acusar o vizinho pais Rwanda de patrocinar essa guerra, com o intuito de alargar suas fronteiras.

No dia de hoje, informa-se que há um cessar-fogo, mas a cidade de Goma está praticamente paralisada. Nada funciona: escolas, comércio, indústrias. Nkunda está lá pronto para se apossar dela e de outras cidades também. Que Deus nos livre desse revolucionário tutsi!!!
Nós aqui, em Kisangani, estamos ainda em paz, mas isolados. Por causa da guerra no leste, não temos mais comunicação aérea com a capital Kinshasa. Dificílimo também viajar para qualquer outra cidade do interior. Para o leste, nem pensar.

Voltando à mensagem da embaixada, louvo e agradeço a preocupação de nosso embaixador pela segurança dos brasileiros daqui. Mas partir, certamente a gente não iria, nessas circunstâncias. É preciso ficar com o povo!

Kisangani, 31 de outubro de 2008
P. Osnildo Carlos Klann, scj

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Ainda a guerra no leste congolês


Acompanho com tristeza e preocupação os acontecimentos do Leste congolês. Diariamente abro o site de Okapi para ver a evolução dos fatos.

Ontem, o Estado-Maior das Forças Armadas Congolesas (FARDC) fez veemente apelo, um ultimato, ao Grupo FDLR ( Força Democrática de Libertação de Ruanda) para obedecer às declarações de Nairobi (Kenia), voltando para casa (Ruanda) ou permanecendo na RD do Congo, mas como exilados e não como guerreiros. (Em Ruanda eles são perseguidos).

Esse grupo é constituído essencialmente de hutus e de antigos soldados revolucionários de Ruanda e de milicianos interahamwe, que combatem também contra o governo ruandês e provocam a desestabilização do Leste congolês.

O comunicado das Forças armadas da RD do Congo adverte que, se a FDLR nâo obedecer ao processo de Nairobi* terão que endurecer para restabelecer a estabilidade e a paz na região dos Grandes Lagos, com a ajuda das forças da Monuc (Missão da ONU no Congo).

O comunicado diz o seguinte: “ Tratando-se de grupos armados ruandeses, a FDLC e outros, o Estado maior das FARDC da Republica democrática do Congo com o precioso apoio logístico da MONUC, já deslocou, nesses dias, para as províncias do Norte Kivu e Sul Kivu, 11 batalhões de nossas Forças armadas, para restabelecer a autoridade do Estado e pôr em pratica o plano militar contra esses agrupamentos ilegais”.

O Leste congolês é um ninho de grupos guerreiros que disseminam o terror, o medo, a destruição naquela área, derramando muito sangue inocente, como exclamam indignados os bispos congoleses: “Até quando a nossa terra deverá ainda ensopar-se no sangue de seus filhos e filhas?”

Eles denunciam também com coragem o que está por detrás de todas essas lutas: encobrir o roubo dos recursos naturais do país e a exploração ilegal e criminosa de suas riquezas. Não temem os senhores bispos de pôr o dedo na chaga, apontando um plano desestabilizador da região: “balkanizar” o pais congolês pela criação de pequenos Estados como aconteceu na região dos Balkãs, na Europa. E com veemência, eles reagem: “A Conferência Episcopal nacional do Congo lembrará sempre que a integridade territorial, a intangibilidade das fronteiras e a unidade nacional da RD do Congo não podem ser negociadas”. Em sua declaração do dia 13 de outubro passado, os bispos condenam energicamente o nefasto e intolerável recrutamento de crianças para a guerra e tocam num outro ponto fundamental das relações humanas: nâo pode haver paz sem justiça. “A impunidade encoraja novas veleidades insurrecionais”. Não a justiça por aqui.

Em todo esse emaranhado de acontecimentos tristes e dolorosos, perpassa a onda nefasta da corrupção. É o que acabo de ler no noticiário de hoje (23.10): a assembléia nacional criou uma CPI para verificar os possíveis desvios dos fundos destinados para as tropas que lutam no Norte Kivu e a ajuda humanitária enviada para os refugiados de guerra. Infelizmente aqui a corrupção já está institucionalizada. Nada se realiza sem ela.

Que a paz habite em nossas fronteiras!

Kisangani, 24 de outubro de 2008

P. Osnildo Carlos Klann, scj
Foto: refugiados de Goma, cidade do leste congolês

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Noticias de Kisangani

Festa do padroeiro


Dia 28 de setembro celebrou-se a festa do padroeiro da paróquia São Gabriel. As festas daqui não têm o sabor das de lá. Apenas uma missa mais solene; às vezes, desfile das pastorais e movimentos da paróquia, e um almoço. Mais nada. A missa foi bem solene. Um colega meu filmou algumas partes dessa celebração. Vou enviar algumas copias com o P. Mateus Buss, que fará suas férias a partir de 15 de novembro p.v. Na missa foram inauguradas as novas vestes dos coroinhas e das “joyeuses”, cujo tecido e confecção patrocinei com o dinheiro que benfeitores dali me deram. Também colaborei com o almoço, caso contrário não sairia.

Capitulo provincial

De 9 a 16 de outubro esteve reunido aqui no Centro Dom Grison, os membros do capitulo provincial da Província Congolesa. Para quem não conhece nossa estrutura jurídica, o capitulo provincial é a autoridade máxima de uma província religiosa, onde se tomam decisões importantes para vida da Congregação em determinada parte do mundo. Esse capitulo também tem a finalidade de preparar o capitulo geral que acontecerá em Roma, no próximo ano. Na foto os participantes do capitulo.


As estradas do Congo

Realmente é uma vergonha o sistema rodoviário da RD do Congo. Os chineses vieram para cá para solucionar o problema; mas ainda não tiveram tempo de consertar estradas e abrir novas rodovias. Nossos colegas de Butembo e Mambasa, do leste e do norte da RD do Congo, vieram para a reunião capitular de carro. Estrada que os chineses estão consertando. Bons trechos já estão prontos. Mas ainda faltam uns 70 quilômetros. 700 quilômetros de infortúnio. Dois dias de viagem. Se fosse só isso não era nada. Mas o pior é que tombaram o carro, por sorte ninguém se feriu. Depois, no trecho inacabado, alugaram motos. Motoqueiros admiráveis que não têm medo de buracos que engoliam as motos nem de água que tocava até os joelhos de todos. Muitos quilômetros a pé, caminhando com lama até meia canela. Depois de um pernoite em que tiveram de dormir com roupa completamente suja de barro, e molhados, pois naqueles cafundós não existe chuveiro, continuaram a viagem até onde foi possível pegar novamente um carro, que os foi buscar, partindo de Kisangani. Depois de dois dias de viagem, chegaram aqui em casa extenuados, sujos de barro até a cabeça e se lembrando ainda do susto do desastre com o carro, que poderia ter levado a todos para o cemitério.

Não é fácil sair de Kisangani. “É preciso muita paciência. Seminaristas de Isangi estão aqui hospedados em nosso Centro D. Grison, esperando a oportunidade de viajar até Butembo, no leste. Têm de esperar 10 dias. Chegaram domingo passado e só terça-feira que vem provavelmente terão condição de continuar a viagem.
Nossos colegas que vieram de outros lugares para o capitulo provincial, ainda estão por ali, esperando a oportunidade para voltar para suas casas. Outros colegas que deveriam ter participado da reunião, não vieram, porque não tiveram chance de pegar um avião.
Viaja-se também pelo rio. Mas é um calvário. O passageiro tem de levar tudo. O navio só oferece o local; comida, leito, cadeira para sentar, tudo, tudo o passageiro deve carregar. Uma viagem de Kinshasa para Kisangani (1000 quilômetros aproximadamente) leva “apenas” três semanas. Na foto, vocês poderão ver um desses navios que faz o trajeto Kinshasa e Kisangani.

Na foto abaixo aparece uma parte de um mercado aqui perto de casa.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Guerra no leste de Congo

Meus amigos e amigas brasileiros, estou lendo no site radiookapi.net, da RD do Congo, artigos alarmantes sobre a guerra que se alastra no leste congolês, mais precisamente em torno da cidade de Goma e Rutshuru, no Nord Kivu. As forças armadas da RD Congo travam combates duros contra os revolucionários liderados por Nkunda, que à força, quer tomar o poder nesse pais. Segundo acusações dos delegados congoleses na Onu, Rwanda, país vizinho e adversário do Congo, sustenta os revolucionários. Localidades inteiras daquela região já se deslocaram, esvaziando suas casa e se refugiando onde podem.
ONGs humanitárias dizem que não sabem exatamente onde milhares e milhares de pessoas estão se escondendo e, por isso, não podem ajudá-las. Tem-se a impressão que a MONUC( missão da ONU no Congo), que atua naquela região, é impotente diante da ferocidade da luta, ou, segundo alguns, está conivente com os revolucionários. Não se sabe ao certo porque a ONU não consegue impor uma paz naquele Estado tão sofrido.
Em Goma, as ruas da cidade ameaçada de ser dominada pelos revolucionários, hoje estão vazias. Nada funciona. Todos os credos religiosos, católicos, evangélicos e mulçumanos, se uniram para fazer orações pela paz.Mesmo aqui em Kisangani, houve passeata, no dia de hoje, protestando contra a guerra e pedindo a paz.
Certamente o mundo não conhece essa triste realidade que vive esse sofredor povo do leste congolês, com tantas guerras e lutas. Os refugiados já são milhares e milhares, sem as mínimas condições de vida. Se na paz já tinham dificuldade para sobreviver, imaginem o que é agora, em tempo de guerra.Quem conhece a língua francesa e deseja seguir um pouco o desenrolar dessa triste guerra pode acessar www.radiookapi.net

Rezemos pela paz!
Por enquanto estamos em paz!
P. Osnildo, scj

Leia a entrevista de pe. Osnildo sobre "Missão" >> clique aqui

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Notícias do Congo

Meus amigos(as), envio-lhes essa noticia não tanto pelo interesse que ela possa despertar em vocês, mas para manter vivo esse contato, como expressão de meu carinho e amizade com todos e com cada um (a) de vocês.Aqui não acontecem grandes coisas. Mas a vida é feita de coisas simples e é preciso saber captar a beleza e o encanto nas coisas simples de cada dia. Minhas saudações, minha bênção e o desejo de uma ótima semana para todos . P. Osnildo

As 9 horas de hoje, 20 de setembro, missa na catedral de Kisangani com a presença do P. Gobbi e da Imagem peregrina de Nossa Senhora, do Movimento Mariano sacerdotal. A igreja estava superlotada. Gente por todos os lados, ao redor do templo, que olha contemplativo para o volumoso e majestoso Rio Congo.

Presidiu a celebração. D Marcel, administrador apostólico dessa arquidiocese. A missa aqui revela sempre uma grande riqueza de expressões lingüísticas: a celebração começou em swahili e francês; os comentários, sempre em swahili; as leituras foram feitas em francês, menos o evangelho cantado em swahili; o sermâo feito pelo P. Gobbi em italiano, traduzido para o swahili; o prefácio, em lingala; a oração eucarística, em francês; alguns cantos em latim, francês e swahili. Imaginem a confusão de línguas. E eles entendem.

Após a missa cumprimentei o P. Gobbi ,que mostrou um interesse muito grande, quando disse que era brasileiro. Inclusive, deu-me maior atenção que aos outros “abbés” (padres) que o estavam cercando para tirar com ele fotos. Tenho a impressão que ele gostou muito do Brasil, quando por lá passou. Não sei exatamente quando foi esse momento.

Durante as 3 horas de duração da missa, tive tempo suficiente para rezar por todos vocês, não esquecendo ninguém. Um abraço.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Noticias da Província do Congo

Início do ano escolar
O ano escolar está começando. São muitas e muitas as crianças, adolescentes e jovens que estudam, em péssimas condições, infelizmente. OS professores, em constante tensão nervosa, trabalham sem gosto porque não recebem o salário. E quando o recebem são migalhas. 20.000 francos congoloses ( aproximadamente 39 dólares). Por causa da greve, logo no inicio, jà se perdeu uma semana de estudo. Ainda hoje, dia 8 de setembro não começaram as atividades escolares nas escolas do governo.

Exame do Estado
No fim do ano escolar, o governo federal promove um exame geral para os alunos que terminam o 6° ano do segundo grau ( le secondaire). Esse exame é comparado ao nosso vestibular.. Quem passa, tem acesso à faculdade. Por isso, a tensão dos finalistas, nesses últimos dias, estava em alta, curiosos por saber o resultado. O governo fez parceria com a Vodacom ( companhia telefônica de celulares) para anunciar os resultados. Foi uma confusão danada. Publicaram resultados não oficiais. Houve aluno que teve três notas diferentes. Houve até caso de morte, por causa dessa confusão. Aluno que na versão não oficlal da Vodacom tinha passado sofreu a amarga decepção de ver seu nome entre os reprovados, na publicação oficial. Finalmente, os resultados apareceram e os que passaram, festejaram com farinha na cabeça...

Centro Dom Grison
O diretor do Centro está de férias na Itália, cuidando inclusive de sua saúde. No momento, estou substituindo-o. Hà sempre movimento de pessoas que vem para cá. As vezes são grupos, mais ou menos numerosos; outras vezes, são religiosos ou religiosas que, sozinhos, desejam fazer alguns dias de recolhimento.
Como já lhes escrevi, nosso Centro de Espiritualidade está em fase de ampliação. Será realmente uma grande e majestosa casa de retiros e também hotel. No momento os trabalhos de construção estão paralisados, porque o responsável pela construção, o Irmão Joss, está de férias na Bélgica. Volta em outubro.

Os combonianos desalojaram de seu prédio os estudantes de filosofia de Kisangani. Urgentemente era preciso construir outro prédio para o reinicio das aulas em outubro. As congregações que tem estudantes de filosofia aqui, se reuniram e resolveram comprar um terreno ( por sinal, o lote que foi comprado era do nosso escolasticado de filosofia) e construir uma ala para a faculdade de filosofia.
P. Vilson Hobold, nosso provincial e catarinense de Itapiranga,SC, não contou tempo. Arregaçou as mangas e com os operários (numerosos) que trabalhavam aqui no Centro Dom Grison começou a obra, há pouco tempo. Está já como se vê na fotografia em baixo. Em outubro, os estudantes estarão de casa nova. Para nos vai ficar muito bom, pois fica perto onde moram nosso estudantes.
A ala tem 62 metros de comprimento por 12 de largura, com três salas de aula, as secretarias, uma biblioteca, uma sala de computação e toaletes.

domingo, 31 de agosto de 2008

Acontecimentos importantes

Meus amigos, envio-lhe uma curta reportagem sobre o que vivi aqui, depois de meu regresso. Estou muito bem de saúde e muito contente, também, com tudo o que aconteceu durante minhas férias no Brasil. Obrigado pela sua cooperaçâo e amizade.

P. Osnildo

Cheguei de volta a Kisangani, dia 8 de agosto. Logo comecei minha atividade, pregando retiros. Foram 3 até agora. Dois sozinho. O terceiro em colaboração com dois outros sacerdotes.
Ontem, dia 30 de agosto, participei de um evento simples, mas muito importante para a vida social e econômica de nosso bairro. 20 senhoras receberam o diploma por terem participado, com aproveitamento, durante dois meses, de um curso de arte-culinária e de confecção de outros produtos, patrocinado por uma ONG de Kisangani. Essa ONG se dedica a esse ensino, em vista do desenvolvimento da cidade.
As diplomadas apresentaram o fruto do curso: bolos de aniversário, de casamento; pãezinhos, doces, sucos das diversas frutas que aqui existem (abacaxi, banana, limão, laranja etc.), geléias. Inclusive, aprenderam a fabricar sabão.
Para a nossa realidade, foi um evento de real significação. Semente de outras iniciativas similares, como por exemplo, a fabricação de alimentos de multi-mistura e um curso de gastronomia. Matéria prima, existe aqui; falta conhecer como aproveitar melhor tudo o que a natureza oferece.
A coordenadora desse grupo de senhoras de nossa paróquia já está construindo um pequeno quiosque de tijolos para vender os produtos fabricados por elas.
Terminada a apresentaçâo, os convidados puderam degustar as guloseimas fabricadas e provar os bons sucos produzidos com as frutas daqui. Tudo muito gostoso. Parabéns!
Como é habito aqui, a cerimônia contou com cantos e dança.

sábado, 9 de agosto de 2008

Edição 25

Meus amigos (as), antes de voltar a Kisangani passei quatro dias na capital a RD do Congo. Conheci um pouco a cidade. São aproximadamente 5( cinco) milhões de habitantes. A cidade possui alguns modernos supermercados, onde se pode comprar quase de tudo. A movimentação de pedestres nas ruas é coisa inimaginável.
E o trânsito caótico. O tansporte urbano, feito em geral com velhas combis, é desumano. As pessoas vão amontoadas, literalmente, amontoadas naqueles pequenos veículos, quando não penduradas por fora. Vi um trem passar. Que horror!!! Uma multidâo pendurada nas portas e janelas e um número maior ainda, viajando em pé no telhado do trem. Coisas dantescas! Como sofrem os congoleses!! Mas pude tambem admirar a fé e a bonita participação dessa gente na Santa Missa quotidiana. Muitas pessoas, homens e mulheres, vêm participar da missa em nossa capela, às 6h da manhâ, rezando com o celebrante a liturgia das horas.
Recomeço já meu trabalho. Amanhã começo a pregar um retiro para religiosas. Rezem por mim. Estou muito bem. Minha viagem de Kinshasa até foi boa, como a do Brasil até Kinshasa.. Que Deus seja louvado. Dessa vez não perdi minha mala!

Um abraço a todos.
P. Osnildo

domingo, 1 de junho de 2008

Quase quebrei o nariz...

Dia 17 de maio, o diácono Richard e eu continuamos as visitas ás capelas. Hoje foi a capela de São Rafael, no bairro Batiambobi, do outro lado do rio. A travessia de 40 minutos foi tranquila. Mas o desembarque foi desastroso. A beach (chamam de beach o local do embarque e desembarque das pessoas) era muito ruim. O terreno molhado, inclinado, sem nenhuma árvore ou galho ou qualquer outra coisa para a gente se segurar. Eu, com um pé na piroga e outro na terra, sem ter em que me apoiar, dei o impulso para sair do barco e escorreguei com a perna de apoio e lá fui eu de nariz contra a canoa. Graças a Deus, nem os óculos sofreram nada. Nem quebrei o nariz, o que poderia ter acontecido muito bem, pois o tombo foi feio.

Breve caminhada pelo mato e chegamos à aldeia. Como todas elas aqui: pobreza extrema, ranchos de bambu e de argila. Assim também é a capela. Pouca gente na missa. Mas cantam muito e muito alto. Como sempre, há alguns garotinhos (as) que dão o espetáculo da dança. Bonito.

Depois da missa, fomos à casa do catequista para uma breve reunião. Reclamam que não têm mais enfermeira para o dispensário, pois os responsáveis da Rive Gauche não permitem mais que sua enfermeira vá cuidar dos doentes de Batiambobi, porque algumas pessoas do bairro a maltratavam. Não sei como, mas essa é a queixa da enfermeira.
Depois da reunião, ali mesmo, o almoço. Cardápio, como sempre: arroz, em grande quantidade, sombe e alguns pedaços de galinha. Para mim, havia um prato de louça, com uma colher. O diácono recebeu um prato de alumínio, com uma colher também; os três outros homens que lá estavam comeram na tampa das caçarolas. Dois outros senhores ficaram olhando. Não sei se comeram depois de nossa saída. As mulheres aparecem para servir e para se despedir. Somem. O que me chamou a atenção foi o apetite desses senhores. Comem bem e com gosto.
Sombe (folha de aipim), que faz parte obrigatória do cardápio desses nossos irmãos, é um alimento muito rico. Por isso, creio, o pessoal daqui, mesmo comendo pouco, tem um aspecto bonito e não dão a impressão de passar fome. O segredo está nessas folhas e em outros legumes que comem.

A volta foi por outro beach. Caminhamos mais de meia hora até chegar lá. Foi mais fácil embarcar. Como os reis magos, fomos por um caminho e voltamos por outro!


Minha prece numa tarde de domingo

Partimos às 8h,30 m de casa, os dois missionários: diácono Richard e eu. Na moto. Ele na direção; eu na garupa. Percorridos os nove quilômetros que nos separam das margens do Rio Lindi, do qual não tenho boas recordações, contratamos uma piroga (canoa): 2.000 francos congoleses (+ou- 3 dólares americanos). Embarcamos: a moto, os dois missionários, mais dois passageiros e os dois remadores. Recordando o tombo na água, nesse mesmo rio, veio-me um certo receio, pois a canoa pendia para um lado, por causa da moto e dos outros dois passageiros. Graças a Deus, a viagem terminou bem.

Chegamos no outro lado e devíamos percorrer mais 8 quilômetros até a capela de Santo Agostinho em Yaongonda. Devíamos, mas a moto não quis. Emperrou como um burro teimoso. Não houve quem a fizesse funcionar. O jeito foi esperar a chegada do P. José, pároco interino de São Gabriel que iria visitar uma outra capela na mesma direção. Fui com ele e meu colega de missão teve de voltar para casa, com a moto em “pane”.

Naturalmente, cheguei com pequeno atraso. Mas como aqui o tempo não tem grande importância, o atraso não significou nada. Como o diácono não veio comigo, tive de fazer a homilia. Mas, a meu lado havia um tradutor, pois pouca gente naquele bairro conhece o francês. Deu tudo certo. A capela é pequena, pobre, mas um pouco melhor que as outras que já visitei. Como em todas elas, cantam com todo o fôlego, com entusiasmo.

Após a missa, fizemos uma rápida reunião com os responsáveis da capela. Seu projeto: querem fazer uma plantação de amendoim, de milho e de outros produtos, para obter algum dinheiro para comprar alguns bancos para a capela, pois os fiéis não têm dinheiro. O problema é que não tem dinheiro nem para comprar as sementes. Vamos estudar o caso com o pároco.
Apos a reunião, o almoço. Cardápio bem frugal: lituma (banana amassada) com carne de galinha no molho.

Fiquei conversando com o pessoal que me perguntava de tudo sobre o Brasil. Eles têm muita curiosidade a respeito de nosso país. A conversa esticou, esticou e o padre José não vinha mais me pegar para voltar para a casa. Depois de varias tentativas, consegui me comunicar com ele. Explicou-me, então, que havia um grave problema naquela capela por causa do diretor da escola católica que havia ficado com o dinheiro do salário dos professores. Junto com o P. José tinha ido um senhor, membro do conselho de educação das escolas católicas da região de Kisangani, que reuniu a comunidade para ouvir e fazer um relatório dos fatos ao responsável das escolas católicas. Por isso, a demora.

Partimos de lá pelas 16 horas. Ao chegar no beach, tive uma sorte imensa: o ferry boat, há pouco inaugurado, estava de partida para o outro lado. Aproveitei a carona, mas meu colega teve de voltar para pegar o senhor que tinha vindo com ele.

O ferry boat faz a travessia somente quando aparece algum carro. O preço é demais: para atravessar os 300 metros, mais ou menos da largura do rio, cobram 15 litros de combustível (cada litro custa aproximadamente 1,60 dólar americano). Para a nossa realidade aqui é um preço exorbitante. Quando aparece um carro disposto a pagar esse preço, os pedestres aproveitam, pois não pagam nada.

Após essa série de contratempos desse domingo, voltei para casa, descansei um pouco, pois estava cansado mesmo e depois fui fazer minha prece. Agradeci o Senhor por ter terminado tudo bem nesse domingo. Apesar do problema da moto, dos atrasos, da espera, do medo da travessia, apesar de tudo isso, pude transmitir um pouco de alegria e paz àquela gente.
Rezei também por eles, pois vi, mais uma vez, a aflição desse povo. Sempre a mesma queixa: não ganham nada; passam fome, não têm o que fazer, não vêem esperança nesse país.
Que Deus olhe por esse povo sofredor e desperte as consciências de seus dirigentes e responsáveis para dar-lhe condições de vida digna, de paz e prosperidade.
Foi minha prece nessa tarde de domingo!

Kisangani, 19 de maio de 2008
P. Osnildo Klann

sábado, 10 de maio de 2008

O barco virou...

Meus amigos e amigas, hoje foi o dia do barco virar...

Fr. Richar, diácono, e eu estamos fazendo as visitas às capelas. Eu celebro a missa e ele prega e faz as reuniões. visitamos, nestas duas últimas semanas, três capelas. Uma desse lado do Rio Congo. Duas do outro lado, a Rive Gauche, como chamam aqui.
Hoje estava programada a visita à capela do Bem-aventurado Bakanja, no bairro Lokolongo, do outro lado do Rio Lindi, afluente do Congo. Fomos de carro até à beira do rio. Ali, pensávamos que estivesse nos esperando alguém da capela a ser visitada. Ninguém. Esperamos uma meia-hora. Nada. O frater começou a negociar o preço das pirogas ( canoas). Acertou com uma pequena canoa o preço de 2.OOO francos congoleses ( aproximadamente U$ 3.50).
Embarcamos na pequena piroga.. Mas apenas tínhamos saído do beach ( porto) a canoa virou... fomos nós com mala da missa, livros, sacolas, tudo na água. Graças a Deus o rio ainda não era muito profundo ali. Dava pé. Mas saímos como pintos molhados, derramando água por todos os lados. Voltamos frustrados para casa. Mais ainda chateados, porque meu colega, o Fr Richard, perdeu sua sacola com a túnica de sua ordenação, estola e Bíblia. Certamente, no meio da confusão, alguém se apoderou da sacola, pois ele saiu da água com a sacola às costas.
Hoje foi o dia em que o barco virou, e foi deixar virar...

Pe. Osnildo Klann scj
06 de maio de 2008 - por e-mail

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Edição 22

Minha primeira missa
(27 de abril de 2008)

Pela primeira vez, fui celebrar missa, em swahili, numa capela do interior de nossa paróquia, no Bairro Babula, capela Nossa Senhora do Caminho ( Notre Dame de la Route), não longe do Centro de Simisimi.
Comigo foi o diácono Richard, para fazer a leitura do Evangelho e fazer a pregação, pois não consigo ainda falar o swhali nem o lingala.
Em todas as igrejas e capelas do Congo, há sempre um coral, que canta realmente com entusiasmo e canta bastante. Os cânticos são geralmente longos. Na missa, dominical cantam todas as partes possíveis, inclusive o Credo. Aqui não foi diferente. A participação dos fiéis é intensa: cantam, dançam, gritam, riem...
A capela é pequena e pobre. Durante a homilia, que o diácono fez em lingala, pois ele também não conhece ainda bem o swahili, minha imaginação voou para longe, pois não entendia nada do que ele falava. Vi-me em concelebração com o Papa João Paulo II, em sua capela particular; vi-me em concelebrações na Basílica São Pedro, em Roma. E agora aqui, na humilde e pobre capela de Nossa Senhora do Caminho. Em vez das paredes e tetos ornados de pinturas celebres, afrescos de pintores famosos, vejo o teto todo furado; as paredes sem pintura, feitas de bambu e argila, quase caindo. Em vez de vitraux com cenas biblicas, vejo janelas como de nosss prisões, so que em vez de ferro, os retângulos são de bambu. Em vez do assoalho de mármore, vejo a terra batida, irregular, cheia de buracos e pó. Em vez do altar e das alfaias de rico material, vejo um tronco rústico servindo de altar e alfaias sujas. Em vez de bancos de madeira escolhida, vejo bancos de bambu, com assentos de troncos de árvore mal cortados. Em vez do ar condicionado, um calor insuportável. Olhando para fora da capela, em vez do espetáculo maravilhoso de uma Praça São Pedro, vejo o mato crescendo, a rua esburacada, o capim ao redor da capela. Em vez de fiéis bem vestidos, com roupa de luxo, sapatos da moda, perfumados, vejo mulheres, homens e crianças, vestidos humildemente, transpirando muito e sem perfume; alguns descalços, outros de chinelos, poucos com velhos sapatos.
Mas o essencial é tudo a mesma coisa: tanto lá como aqui nessa humilde capela, onde o diácono está pregando, o CRISTO se faz presente na hóstia, não bem redonda, e no cálice nem de ouro nem de prata. O espetáculo maravilhoso do milagre da Eucaristia repete-se aqui como lá. Sem nenhuma diferença. O valor da missa não está na riqueza do ambiente, mas no amor infinito de um Deus que se faz presente no meio de nós, sob a espécie do Pão e do Vinho.
Sinto-me igualmente feliz celebrando lá como aqui. Talvez melhor aqui, pois aqui precisam mais da gente que lá.
Sob os aplausos dos fiéis, o diácono termina sua homilia e eu, feliz, continuo concentrado agora, minha primeira missa numa capela do interior da paróquia.

Pe. Osnildo Klan, scj
Kisangani, 27 de abril de 2008.

Edição 21

Rumo ao leste congolês
3a. parte

Mambasa

Mambasa é uma pequena cidade, na Província (Estado) Oriental do Congo, a 140 quilômetros a norte de Beni e a 200 quilômetros de Butembo. A Província SCJ do Congo possui ali uma importante missão.
Por insistência do P. Silvano Ruaro, administrador daquela obra missionária, aproveitei a viagem do Superior Provincial, P. Vilson Hobold, com o norte-americano P. David Szakowski, para visitar Mambasa. Valeu a pena o sacrifício da viagem não muito confortável, por estrada péssima e com o carro cheio de passageiros e de mercadorias.
P. Vilson e P. David vieram de Kisangani, no pequeno avião russo que faz, há anos, esse trajeto Kisagani-Beni. Eu parti de Butembo, num carro fretado. Durante o percurso, Butembo-Beni, enfrentamos duas terríveis tempestades, com chuva de pedra, ventania, relâmpagos... Só pensava em nossos viajantes de avião. Realmente, eles sofreram muito para pousar em Beni. Tiveram de ficar rodando sobre a cidade durante ao menos 30 minutos para encontrar uma brecha entre as nuvens carregadas e descer apressadamente no aeroporto. Graças a Deus, deu tudo certo, apesar do susto.
As 15h30m do dia 21 de março, partimos de Beni rumo a Mambasa. Estrada péssima, mas transitável. Ao longo do percurso de 140 quilômetros, pequenos e pobres lugarejos, com casas de barro, cobertas de palha. É a constante e triste realidade do Congo. Muita gente pelo caminho. Principalmente crianças, maltrapilhas, inúmeras, sem conta, brincando em frente às suas casas, em terrenos, muitas vezes úmidos, sujos; convivendo com esgotos, a céu aberto, águas estagnadas, lameira.... Depois de 30 quilômetros, entramos na espessa mata equatorial do Congo. Mesmo no meio da floresta, encontram-se vilas e grupos populacionais.
Após 4 horas de sofrida viagem, chegamos, à noite, em Mambasa. Mesmo no escuro, tive uma ótima primeira impressão de nossa missão. Aqui também não há energia elétrica. Somente motor. Fomos fraternalmente acolhidos pela comunidade de lá. Nossos quartos não eram uma “brastemp”, mas muito bons e confortáveis.


Nossa missão de Mambasa

No dia seguinte, de manhã, fui visitar as dependências de nossa “missão”. Como sempre, as missões possuem muito terreno para suas obras. Aqui são 140 hectares, nos quais se encontram: igreja paroquial, moradia dos padres, escola de segundo grau, escola profissional, oficina mecânica, um hospital em construção, pastos para criação de gado, campo de futebol e de basquete, pistas de corrida, plantação de palmeiras, soja, banana etc. Como em outros lugares, também aqui a invasão de terras é muito comum. Muitas famílias jà moram dentro da propriedade da missão.Admirei muito a limpeza em redor da escola e mesmo as salas de aula, simples, com pobres bancos, mas em ordem, bem limpo tudo. Boa impressão! Além do curso normal, com 850 alunos, há a escola profissional, onde se ensina carpintaria, marcenaria, corte e costura, mecânica. São 58 professores que ganham aqui US 120,00 ( cento e vinte dólares). Coisa extraordinária para essa realidade. ( Em Kisangani, os professores estão ganhando 45 dólares, quando ganham). P. João Paulo, que estudou teologia na Faculdade Dehoniana de Taubaté, é o diretor da escola e dá um curso de administração e política, preparando os futuros lideres da cidade. Esse curso ele fez em São José dos Campos, SP.
Nossa missão de Mambasa administra duas paróquias: Nossa Senhora do Rosário, dentro da próprio terreno da missão e a paróquia Mãe da Igreja, que fica numa vila distante, chamada Nduye, onde se encontra a tribo dos pigmeus. Por muitos anos, P. Longo, italiano, evangelizou essa tribo e agora corre seu processo de beatificação. Foi morto em 1964, na rebelião dos simbas.
O diretor geral da missão é o P. Silvano Ruaro, dinâmico empreendedor e zeloso apostolo. Com a ajuda financeira de inúmeros benfeitores da Itália, principalmente, mantém essa obra de grande importância na promoção humana daquela cidade.


Epulu

No período da tarde do Sábado santo, fomos visitar o Centro de Conservação e de Pesquisa de Epulu, um dos nove parques e reservas naturais do Congo. Dista 70 quilômetros de Mambasa, na estrada que vai de Mambasa a Kisangani, em construção pelos chineses. A estrada que vai ligar essas duas cidades, distantes 550 quilômetros uma da outra, é muito boa e em breve estará completamente concluída, faltando apenas uns 70 quilômetros. Dentro de dois meses, segundo dizem, os chineses começarão a asfaltar essa via. Assim, Kisangani ficará ligada por estrada, com outras cidades. Pela primeira vez, no Congo, viajei a 80 até 90 quilômetros por hora.
Essa reserva natural é conhecida pela raridade que guarda: os “okapi”: girafa da selva. Seu pescoço é menor que o da girafa, seu corpo se assemelha muito a um cavalo e na parte traseira possui listras brancas como as zebras. Só comem alguns tipos de ervas, que deverão estar sempre no alto, porque eles não se abaixam para comer. Esses animais são naturais do Congo e alguns se encontram em zôos americanos e europeus. Estima-se em 10.000 a 20.000 a população de okapis nessa reserva, que possui 13.762 km2 . Outra grande característica desses animais: vivem sempre isolados.
O lugar é muito bonito, ao lado do rio Epulu, mas não tem ainda uma infra-estrutura turística. Falta restaurante, sanitários, loja de lembranças... Nada disso existe ainda lá. Espera-se que a abertura da estrada Kisangani-Mambasa possa trazer um pouco de turismo para esse rico e belo centro de reserva natural..


Vigília Pascal

Às 20 horas desse Sábado santo começou a vigília pascal na paróquia N.Sra do Rosário. A celebração foi fora, em lugar apropriado, bem preparado, cercado de palmeiras com bom serviço de som, bem iluminado e com um amplo palanque para o altar.
Naquela noite, ventava muito e foi uma luta manter aceso o Círio pascal até o fim da missa.
Foram quatro horas de celebração, com muitos cânticos, danças, leituras e um impecável serviço dos coroinhas e as conhecidas danças das “joyeuses” (as alegrinhas: crianças que dançam durante a missa). Chamou-me a atenção a qualidade das leituras bem feitas pela equipe litúrgica. Foram feitos 25 batizados, durante essa celebração.
Após a celebração, que terminou pela meia-noite, comemoramos um pouco a Ressurreição e fomos logo dormir porque, domingo de Aleluia, a missa é às 7horas da manhã. Viagem de volta
A missa do domingo durou apenas duas horas. Mas foi também muito bem participada e com muita gente inclusive.Às 13h30m partimos de Mambasa, sempre de camioneta, cheia de passageiros e de mercadorias. De novo, viagem muito desconfortável tanto pela aperto dentro do veículo, quanto pelos sacolejos do carro nos inúmeros buracos da estrada.

A viagem tornou-se até agradável, apesar de tudo, pelas jocosas “tiradas” do P. Vilson, que faziam rir a “bandeiras desfraldadas”, os passageiros da grande viagem de 7 horas até Butembo (Kiragho), onde chegamos pelas 20h30m.
Depois de gostosa janta, fomos logo dormir, agora no frio de Kiragho, não mais no calor de Mambasa. Nossa viagem de volta a Kisagani aconteceu no dia 25 de abril, no velho bimotor russo. Foi uma viagem muito tranqüila de 1hora 50 minutos.



Conclusão

Foi muito enriquecedora para mim, tanto espiritual quanto humanamente falando, essa viagem ao leste congolês. Conheci um Congo um pouco diferente, mas sempre sofredor, pobre, necessitado de tudo. Vislumbrei, na região, alguns sinais de progresso e de possibilidade de melhoria de vida. Mas o caminho a percorrer é ainda longo. É preciso, antes de tudo, mudar a mentalidade e abraçar a solidariedade, deixando de lado as lutas tribais e a disputa pelas riquezas e bens materiais que essa terra oferece.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Edição 20

Prezados amigos e amigas, envio-lhes a 2a parte do artigo sobre minha viagem ao leste congolês. Antes, porém, quero fazer uma "corrigenda" ao artigo anterior. Como escrevei, as estatísticas daqui não são muito confiáveis. Na verdade, pesquisando mais, descobri, em publicação recente, que a informação do comerciante de Butembo sobre a população dessa cidade não corresponde à verdade. Ele me dizia tratar-se de um rescenseamento do tempo das eleições. Ora, em tempo de eleição pode ser que até alguns "mortos" sejam contabilizados em vista da votação!!!! A população de Butembo é de 165.333 habitantes, não de 800.000 como erradamente escrevi na primeira parte. Obrigado pela compreensão.

P. Osnildo

Rumo ao leste congolês
2a parte

Noviciado Sagrado Coração de Jesus

Nosso noviciado situa-se numa colina, a 1.700 metros acima do nível do mar, 100 metros mais alto que o centro de Butembo. E(é) uma construção nova. São 5 blocos, mais o pavilhão da garagem e da cozinha. A capela octogonal fica no centro desses blocos distribuídos à direita e à esquerda de quem sobe por um corredor que liga todas essas alas. São 32 quartos para noviços e visitantes e mais cinco apartamentos para a comunidade religiosa.
Entre as diversas construções, jardins bem cuidados, flores, grama cuidadosamente aparada, trepadeiras ; tudo isso cria um agradável ambiente de paz e tranqüilidade, ainda mais pelo local onde tudo isso se encontra : uma colina enorme de onde se tem uma visão panorâmica espetacular sobre os arredores montanhosos da região.
Fora do recinto do noviciado, dois quiosques, locais para acolher as pessoas, para fazer recreação ou mesmo para estudo e meditação. Além disso, galinheiro, estrebaria, chiqueiro, rancho e contêineres para guardar ferramentas e outros objetos. Não falta, naturalmente, um grande campo de futebol.
O noviciado possui aproximadamente 80 hectares de terra, onde se planta milho, banana, soja, batata doce, mandioca e outros produtos para alimentação. Não falta uma grande horta. Há muita pastagem para vacas leiteiras e ovelhas e uma imensa plantação de eucaliptos, aliás, arvore muito comum nessa região.
São 7 noviços e 5 postulantes. A comunidade religiosa se compõe de quatro pessoas : o mestre de noviços, o ecônomo, o responsável pela Igreja de Kiragho e o irmão administrador.
Durante os 40 dias que lá passei, dei o curso sobre nossa Regra de Vida, isto é, as normas que orientam nosso modo de ser e de agir, como religiosos, seguidores do carisma de P. Dehon.
A impressão que tive é que estava no Tabor. Lugar alto, silencioso, agradável, pois a temperatura era sempre fria e as noites favoráveis a um sono repousante. Sempre com dois grossos cobertores.
Além do curso, ocupei bem meu tempo com muita leitura, meditação, oração. Cada dia fazia meu passeio a pé, durante uma hora, subindo e descendo o morro e observando o ir e vir desse povo, que aqui também é bem sofredor.
O grande problema é a falta de energia elétrica. O noviciado tem um gerador que funciona das 18h30 até às 22h. Não funciona mais porque o olio diesel aqui é muito caro.
Há um projeto de construir pequena usina elétrica, em nosso terreno. Uma entidade caritativa da Alemanha estaria disposta a patrocinar. Por enquanto só estudo, para verificar a viabilidade do empreendimento.
A comunidade possui um carro e um caminhão. O carro estragou. Foi para Mambasa, na oficina. Mas durante todo o tempo que lá estive não tinha ficado pronto, por causa da falta de peças de recambio. O grande problema que aqui se tem é justamente a falta de peças para substituir as estragadas. Se existem são muito caras e, às vezes mais caras que o próprio objeto do conserto.


Kiragho

É um bairro de Butembo. Fica a 12 quilômetros do centro da cidade. A população, é pobre, mas trabalhadora. As casas sâo um pouco melhores que em outras partes. Hà muitas pequenas fazendas de gado : vaca, boi, ovelha, cabrito. Plantam também milho, batata doce, batatinha, aipim cujas folhas, « sombe », são base da alimentação em quase todo o Congo.
Em meus passeios diários, observava a mesma e triste cena de outros lugares do Congo : mulheres e crianças carregando pesados fardos em suas costas : lenha, batata, carvão, óleo, folhas de aipim, farinha, cebola… O mais pesado mesmo, e que faz as pobres mulheres caminharem completamente encurvadas, é a lenha que carregam, quilômetros de distância, para preparar a comida e também para aquecer as frias noites de Butembo.
Os homens transportam essas mercadorias em bicicletas e em motos. E (é) de se ver, a habilidade que têm em carregar as bicicletas de mercadorias. Como há muitos morros, na maior parte do caminho, empurram os veículos.
P. Paul, um jovem polonês, é o responsável da capela de Kiragho, que ainda não tem padroeiro, porque sua construção é recente, e a paróquia não foi ainda erigida, apesar de possuir já uma grande igreja e uma boa casa paroquial. O bispo daqui só cria paróquias com ao menos três padres. Por enquanto a província scj do Congo so dispõe de um padre para essa localidade.
Mesmo não sendo ainda oficialmente paróquia, Kiragho funciona como tal. P. Paul se desdobra para atender não só a futura matriz, como as outras capelas que são também grandes construções. Nesse sentido o povo daqui é bem dinâmico, como já escrevi na primeira parte desse artigo. São pobres, mas dão o que podem pela igreja. O padre não tem ainda carro. Faz suas viagens apostólicas em moto. As missas são em swahili, mas com oração dos fieis e também cânticos em « kindande », a língua local da região. ( Já escrevi em artigos anteriores, que no Congo há aproximadamente 242 grupos tribais e cada grupo tem sua língua própria).
Numa terceira parte desse artigo, vou descrever nossa viagem a Mambasa, onde a Província SCJ do Congo possui uma exemplar obra de promoção humana.

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Edição 19

Meus amigos e amigas, estou-lhes enviando em anexo a primeira parte de meus artigos sobre minha viagem ao leste congolês. Faço por partes para não se tornar longo demais. E de desagradável leitura. Infelizmente, não lhes posso, por enquanto, enviar fotos, pois minha maquina fotográfica foi danificada ( abîmé), como se diz aqui, e não pude tirar nenhuma fotografia. Mas uns senhores italianos que passaram por lá fizeram muitas fotos e deixaram tudo no arquivo do computador de um colega meu aqui de Kisangani, que não teve ainda tempo de me fazer copia. Por isso, o atraso. Boa leitura e se quiserem fazer algum comentário ou algum pedido estou às ordens.
Um abraço. P. Osnildo

Rumo ao leste congolês
1ª parte

Finalmente, chegou o dia de sair um pouco de Kisangani. Desde que aqui cheguei, em 7 de março do ano passado, não tive oportunidade de conhecer outras cidades, alem de passar rapidamente pela capital Kinshasa, na minha chegada ao Congo. Por enquanto, não temos comunicação, por terra, com outras cidades. Aliás, pode-se chegar a outras vilas ou com moto ou bicicleta ou a pé.

A viagem

Dia 15 de fevereiro, parti para o leste congolês. Estava, de fato, muito curioso por conhecer a cidade de Butembo, sobre a qual me falavam muito positivamente, por ter uma geografia bem semelhante à do nosso Estado de Santa Catarina: montanhas, gado, pastos, bananais, temperatura baixa etc.
Fui o primeiro a embarcar no velho bimotor russo, de 18 passageiros, com malas empilhadas no corredor, apertando-me contra a parede do avião, forrada de surrados tecidos escuros. Da pequena janela, não se podia enxergar nada tanto por causa da neblina, quanto pelo vidro todo embaçado .
O vôo de 1hora e 50m foi bem tranqüilo. O pequeno aeroporto, sem asfalto, fica em Beni, cidade vizinha de Butembo. O avião parou bem ao lado do portão do pavilhão de madeira do aeroporto. As malas foram entregues ali mesmo.
Nicolas, o chofer do noviciado de Butembo, esperava-me lá com sua moto. Antes de sair, foi preciso passar pelo serviço de imigração, onde uma burocracia ultrapassada, mais uma vez, exigia o passaporte, de onde tiravam as informações que eram escritas, a mão, num grosso caderno. Além do tempo perdido, tive de pagar US 5.00 (cinco dólares), para entrar no leste congolês.
Eu e uma mala fomos na garupa da moto de Nicolas.. A outra mala pegou carona numa outra moto, para ir até o “parking”, estacionamento dos táxis da cidade.
Esperei muito tempo até completar a lotação do táxi: quatro pessoas atrás, mais uma criança e eu, na frente, ao lado esquerdo motorista, porque aqui, muitos carros têm o volante na direita.
De Beni a Butembo são 55 quilômetros. Logo ao sair da cidade começamos a subir a serra. A estrada se assemelha muito àquela entre Botuverá e Vidal Ramos: cheia de curvas, poeira, pedras e mesmo precipícios. Os bananais, trepados nos morros, dão a impressão que estou indo de Corupá a São Bento do Sul. Ainda mais que é subida da serra !!
A viagem se tornou agradável pelo espírito extrovertido de uma moça que se sentava no banco de trás, no colo de um moço, porque não havia lugar suficiente para 4 pessoas.
Ao longo do caminho vi o que até agora não havia visto no Congo: uma intensa movimentação de carros, caminhões, motos, trazendo e levando mercadorias, de uma cidade a outra. Era um sinal de progresso e de vida dessa região, que fica perto de Uganda, para onde se deslocam muitos congoleses para fazer compras e vender suas mercadorias.
Mas não faltam também, ao longo do caminho, as tolekas e as motos ou com mercadorias : banana, abacaxi, lenha, carvão, roupas, maracujás, óleo, combustível e tudo o que você pode imaginar de produtos simples da terra, ou com passageiros, na garupa.
Como nossos ônibus, no Brasil, fazem suas paradas, ao longo da viagem, assim também, nosso táxi parou num pequeno “marche”, ao ar livre. Logo que o táxi parou, uma enxurrada de pessoas, grandes e pequenas, crianças e jovens, mulheres e homens cercaram o carro, oferecendo seus produtos : balaios estreitos e longos cheios de maracujá (pequenos e roxos), banana, tomate, abacaxis e outros produtos da terra. Na primeira parada, não comprei nada. Na segunda, por insistência da moça de trás, comprei bananas e maracujás. Preço de tudo : 1.000 francos congoleses ( = 2 dólares).
As casas ao longo do caminho são ainda de bambu e barro, uma grande parte já se apresenta bem melhor com cobertura de zinco e paredes de tijolos.
Após duas horas de viagem, aos trancos e solavancos, entramos em Butembo.

Butembo

Cidade de 800 mil habitantes, segundo informação que me deu um comerciante de là, não tem asfalto nem energia elétrica.(NB. As estatísticas daqui não são muito confiáveis). Mas possui um comercio muito movimentado, onde se pode comprar produtos vindos de outros paises, como da China, de Uganda, da Arábia, de Dubai… por preço insignificante ; mas sempre estamos sujeitos a produtos piratas. Mesmo sem energia elétrica publica, à noite, o centro da cidade está iluminado, pois os moradores têm geradores elétricos.
Chamou-me imediatamente a atenção o numero de casas em construção. Casas boas, de tijolos, telhados galvanizados, belas pinturas. Além disso, muitos carros e bons carros, circulando pelas ruas poeirentas e movimentadas da cidade, que nâo possui um plano diretor e as construções são feitas ao bel prazer dos cidadãos. Vejo nesses sinais a presença da classe média surgindo, no Congo.
Outra particularidade : muitas e grandes igrejas católicas. Uma nova igreja recentemente construída, têm lugar para 5.000 pessoas, segundo informação que me deram.
O clero secular dessa diocese Butembo-Beni é numeroso : são 200 “abbés”, como são chamados os padres seculares daqui, dos quais, aproximadamente 35 estâo fora da diocese, ou estudando ou em missão, inclusive, na Itália, ou prestando serviços, como no Vaticano.
Não só o clima é diferente. Também a mentalidade do povo: eles têm iniciativas, trabalham bastante. São pobres também, mas não têm o hábito de pedir tudo. Não esperam por ajuda de outros, dos padres, por exemplo. Eles mesmos se cotizam e constroem e compram as coisas para a Igreja. Possuem um grande sentido da “prise en charge”, como se diz aqui, isto é, se responsabilizam pelas coisas da Igreja.
Butembo está a 1.600 metros acima do nível do mar. O clima é frio, durante todo o ano, e chove bastante.
Está situada numa das mais ricas regiões do país. Fica no Estado de Nord Kivu, limitando-se a leste com Uganda e Ruanda, dois paises que, durante a guerra dos seis dias, no Congo, em 2000, lutaram entre si pela posse dessas terras congolesas. O falecido presidente congolês, Kabila, pai, havia pedido a ajuda militar desses dois paises para derrubar Mobutu. Depois da vitória, os dois exércitos vizinhos ficaram aqui e brigaram entre si, pela posse da terra. A intervenção da ONU pôs fim ao conflito. Mas a tensão e o medo de novos conflitos, na região, continua até hoje, pois hà um ex-general do exercito congolês, Nkunda, um rebelde refugiado em Ruanda, que, com o apoio desse pais, faz incursões guerreiras nessas áreas, principalmente, em Goma, Bukavu e Massisi.
Recentemente, foi feita uma conferência de paz e de desenvolvimento dessa região. Oficialmente, chegou-se a um acordo. Na prática, porém, as constantes incursões dos rebeldes na região revelam que a situação de guerra continua ainda. Pois o general rebelde exige como condição de paz que o Congo expulse de seu pais todos os hutus.(NB entra aqui a eterna rivalidade entre tutsis e hutus, dos quais falarei num próximo artigo).
Além desses problemas, essa região era infestada por bandidos do grupo Mayi-Mayi, um tipo de cangaceiros, que atacavam a populaçâo, roubando, matando, pilhando as casas. Por enquanto, estão eles mais calmos, escondidos, com a presença do exercito da ONU. Mas quando as tropas da MONUC (missão da ONU no Congo) se retirarem nâo sei o que poderá acontecer.
As 18h 30, chegamos ao fim da viagem, em nosso noviciado de Kiragho (pronuncia-se Tchirao). Estava cansado. Mas contente e cheio de expectativas pelos próximos dias em Butembo.

Sobre nosso noviciado e sobre os dias que ali passei, escreverei na 2ª parte desse artigo.

quinta-feira, 27 de março de 2008

Comissão Missionária BC

Estimados confrades formadores

Dia 24 foi o aniversário de batismo do nosso fundador, Pe. Dehon. Ante-ontem tivemos o aniversário da aceitação da missão no Congo em 1897. Estes dois fatos me dão motivação para escrever hoje para as nossas casas de formação sobre a animação missionária.

A missão do Congo é a mais antiga da Congregação e talvez também a mais carente de ajuda financeira e de pessoal até o dia de hoje, “uma verdadeira missão”, como escreveu Pe. Dehon no seu último caderno do Diário: “A 6 de julho de 1897: primeira partida para as missões do Congo, que foi a obra mais importante da Congregação, entre todas as nossas obras de apostolado”(p. 64). Sendo fundador de uma congregação o interesse de Pe. Dehon era muito acertado em enviar religiosos para as missões. Isto sempre significa desafio mas também oportunidade de deslanchamento, pois quem se abre para às necessidades do mundo inteiro tem dentro de si todas as oportunidades de desenvolvimento e crescimento. Ou seja, quem dá espaço para o altruísmo rompe todas a raízes do egoísmo e não há conversão maior do que esta. Dizia ele: É evidente que o Sagrado Coração de Jesus será melhor honrado, se o zelo pela sua glória se exerce em condições difíceis, como nas longínquas missões. Cumpre-se então um ato de abnegação que é grande prova de amor para com Nosso Senhor”(LC, no. 162).

Pe. Dehon se preocupava muito em cultivar as vocações missionárias. Isto ele demonstrava quando escreveu para Pe. Adriano Guillaume, em dezembro de 1910: “Poderíamos fazer muito pela alegria de Nosso Senhor e da Igreja, se tivéssemos mais missionários no Congo, no Canadá, etc... Procurai muitas vocações, fazei realmente os vossos garotos rezar com esse objetivo”(PPD, 448). Em julho de 1919 expressa seu grande sofrimento pela escassez de vocações missionárias, por causa da primeira Guerra mundial e reconhece que existe um clima propício para vocações missionárias: um bom número dentre nós deseja levar o amor do divino Coração às terras infiéis”(PPD,395) .

Em 1922 falando das exigências de pessoal qualificado para as missões: “Rezai pelo nosso recrutamento: as nossas missões exigem muito pessoal! Não queremos só o número, mas sobretudo o fervor e a generosidade”(LC, n. 287); e em dezembro de 1923: “trabalhemos corajosamente pelas nossas missões e recrutemos muitos missionários(LC, p 295).

Como dizia Pe. Osnildo Klann em sua carta de 17 de outubro do ano passado(2007), escrevendo da África, desde que foi celebrada a primeira missa no Congo em 25 de dezembro de 1897 até aquela data, por lá tinham passado 410 missionários estrangeiros. Ele escrevia: “A missão que Pe. Dehon tanto amava e pela qual lutou muito, sofreu ao longo de sua história, teve momentos difíceis: no início, as doenças ceifaram muitas vidas jovens de religiosos missionários, que para aqui vieram cheios de entusiasmo, para evangelizar esses povos”.

Demorou muito para a missão do Congo conseguir razoável número de vocações autóctones. Neste processo os missionários brasileiros tiveram especial participação. Hoje a situação é promissora: “São 90 religiosos: 41 padres, 3 diáconos, 3 irmãos e 43 religiosos de votos temporários (estudantes de filosofia, teologia e estagiários)”dizia Pe. Osnildo.

Além de Pe. Osnildo Klann temos lá no momento outros missionários brasileiros: Pe. Mateus Buss, Pe. Vilson Hobold e Pe. Joaquim Tomba.

Destaque na história da missão do Congo deve ser dado a Pe. Grison, que antes tinha estado no Equador e de lá foi expulso com Pe. Gabriel Lux. Pe. Dehon precisando dele e de Pe. Gabriel e lhe dizendo que a missão no Congo seria muito difícil, ele respondeu: “Nada é difícil; vós nos mandais, nós obedecemos. Isso basta.”(cf Philippe, Souvenirs, II, 3). Pe. Grison tinha 37 anos quando chegou ao Congo em 21 de setembro de 1897. Se instala às margens do Rio Congo, próximo a atual Kisangani e inicia a Missão de São Gabriel em cuja capela 83 anos depois iria rezar o Papa João Paulo II na visita que fez ao país.

Pe. Gabriel Lux depois de um mês adoeceu gravemente e teve de voltar para a Europa. Mais tarde Deus precisou dele para iniciar outra missão, no sul do Brasil, cuja história a nos é mais conhecida. Naqueles inícios a missão foi muito difícil. De 28 missionários só 15 conseguiram aclimatar-se até 1904. A missão contava com 25 a 30 centros missionários e cerca de 2500 cristãos além de 3500 catecúmenos contando com 20 missionários(14 sacerdotes, 1 irmão e 5 freiras), 6 morreram e 6 tiveram de voltar para a Europa. Em 1908 a missão do Congo torna-se vicariato e Pe. Grison é ordenado bispo. Morre em 1942 com 81 anos. Nessa data já 52 missionários tinham dado a vida pela causa missionária. Junto à Igreja da missão em São Gabriel se encontra o túmulo de D. Grison. Para dar proteção ao túmulo foi construída uma cerca de estacas. De uma delas brotou uma árvore que hoje cobre o tumulo com sua sombra. O que isto pode ter de simbólico não cabe a nós refletir aqui.

Pe. Dehon nunca conseguiu ser missionário pessoalmente, embora o desejasse. Porém ele foi um homem que em espírito sempre esteve preocupado com esta causa. Se fala que quando tinha apenas 3 membros na congregação, já tencionava enviar um para cada continente. De fato somos uma congregação missionária. Hoje estamos em muitas partes do mundo. No momento estamos até preparando padres para os países de regime comunistas, como o Vietnam, China e outros. Hoje mais do que nunca o nome de Cristo precisa ser anunciado a todos os povos e cantos do planeta. “Para mim anunciar o Evangelho não é título de glória mas obrigação que se me impõe. Ai de mim se eun não anunciar”(1 Cor 9, 16). O Doc. Da Conferência de Aparecida nos orienta a sermos discípulos e missionários, não apenas a nível de América latina, mas a nível de mundo. Solidarizar-se com os nossos confrades brasileiros que estão nas missões, acompanhar o seu trabalho, rezar por eles, é o mínimo que podemos fazer.

Como deve ser reconfortante para um missionário que está a milhares de quilômetros de sua terra natal ele sentir que não está sozinho desempenhando o seu trabalho, mas ele o faz como um representante de toda uma congregação que sintoniza com ele.

Neste ano a Comissão Missionária continuará incentivando e estimulando o espírito missionário em nossas casas de formação. Ano passado tínhamos enviado uma carta lembrando da necessidade melhorar o espírito missionário que é ainda muito tímido em nossas casas de formação, de despertar na juventude na sua natural generosidade. Lembrávamos que, conforme reafirmou a VII Conferência Geral de Varsóvia, “o serviço da missão é constitutivo da nossa Congregação e a nossa resposta ao convite de Cristo” desde as origens. Para tanto precisamos partir para medidas bem concretas como, por exemplo, escolher uma pessoa encarregada da animação missionária, prever atividades ao longo do ano com este objetivo. Foi pedido também que nos enviassem sugestões para a melhoria da animação missionária.

Agradecemos as casas responderam ao questionário. Outras esperamos que o façam ainda este ano. Agradecemos também pelas sugestões vocês puderem também enviar à Comissão Missionária. É tarefa para todos nós dinamizar e espírito missionário de diversas maneiras. Assim mutuamente podemos nos enriquecer colocando em comum tudo o que for relevante.
Para concluir desejo que todos se sintam enviados em missão pelo Cristo Ressuscitado.

Terra Boa, 27 de março de 2008.

Em nome da Comissão de Animação Missionária, ­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­

Pe.Antonio Koptski SCJ

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Edição 18

Caros amigos, realmente, há tempo que não lhes escrevo mais, porque daqui onde estou não é fácil enviar mensagens para todo mundo. Um defeito do computador. E os técnicos raramente aparecem. Tenho alguns artigos já prontos. Espero somente voltar para São Gabriel. Mas isso vai demorar um pouco ainda, porque hoje chega o P. Joaquim a quem estive substituindo durante três meses. Volto amanhã para São Gabriel, mas sexta-feira parto para Butembo no leste congolês. Retorno a Simisimi somente no começo de abril. E em Butembo, pelo que me disseram, não tem energia elétrica, na casa do noviciado, para onde vou, dar cursos aos noviços e postulantes. A experiência aqui na Casa D. Wittebols foi muito boa. O grupo de propedêutas é bem promissor. São nove. Vivi três bons meses com eles.

Nesse período, venci a terceira malaria. Agora estou bem.Tenho muita atividade intelectual, principalmente, conferências e palestras para religiosas e para nossos estudantes. Daqui a pouco mesmo, devo falar aos padres sobre o tema do próximo domingo, a Transfiguração. Em junho e em julho estarei no Brasil, antecipando minhas férias, para participar de dois eventos em nossa família. Espero poder encontrar-m como maior numero possível de meus amigos e benfeitores, que me sustentam em minha missão com suas preces e seu apoio e carinho humano.

A gente se verá.
Um abraço, P. Osnildo

Portal DEHON Brasil

Portal DEHON Brasil
www.dehonbrasil.com