Pe Osnildo Carlos Klann, scj

Desde 2007, o padre Osnildo realiza sua missão dehoniana na República Democrática do Congo e, através de reflexões, notícias e informações, partilha suas experiências missionárias.

Para entrar em contato, escreva para ocklann@yahoo.com.br

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Solidariedade

Prezados(as) amigos(amigas), tenho acompanhado com muita tristeza as trágicas notícias das enchentes, deslizamentos, mortes, destruições em Santa Catarinha, por causa das grandes chuvas que estão castigando nosso Estado. Mesmo de longe, quero fazer-me bem perto de todos aqueles que foram atingidos por essa calamidade, num fraterno gesto de solidariedade cristã. Além disso, posso garantir-lhes minhas preces ao Senhor da vida para que proteja a todos e suscite generosidade e caridade em todos aqueles que podem e devem ir em socorro dos irmãos ncessitados.
Fraternalmente, P. Osnildo

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Muchapa

Meus amigos (as), estive fora do ar, alguns dias, por causa de problemas técnicos. Estou de volta. Envio-lhe uma curta crônica de meu domingo. São as coisas simples que acontecem aqui conosco. Não temos grandes feitos. Apenas as coisas miúdas de cada dia. Em relação à guerra, tudo está em banho- maria. Tenho a impressão que não há interesse em terminar com essa guerra. Um jornal lá do leste que sai uma vez por mês, critica a ONU dizendo que ela não está interessada em acabar com essa guerra. Não sei se essa opinião é válida, mas na realidade, as coisas não evoluem. Obrigado pela sua atenção e amizade.

Muchapa
Como sempre, o “piroguier” chegou com uma hora de atraso. Já estava impaciente, pensando que não viria mais, como aconteceu no primeiro domingo deste mês. Prometeram e não vieram me buscar.
Muchapa é o nome do bairro. O nome é homenagem ao antigo chefe daquele povoado. O patrono da capela é Santo Afonso. Capela e lugarejo paupérrimo. Pouca gente na missa. Mas cantam que é uma beleza. Resultado da coleta: 540 francos congoleses. Nem um dólar. Gastei 3 dólares para atravessar o rio.
Após a missa, fizeram uma partida de futebol em minha homenagem.. Levei a bola. Poucos minutos apenas. O campo, em péssimas condições, chamam de estádio. Entre um tempo e outro, fui almoçar. Um pouco de arroz com um pedacinho de peixe defumado. Ganhei um ovo de galinha. Pedi para cozinhar. Misturei com o arroz. Estava muito gostoso, apesar de tudo frio.
O bairro fica do outro lado do Rio Congo, na margem esquerda. A uns 4 quilômetros daqui. Para ir, 45 minutos; para voltar, rio acima, 1 hora e meia. Na ida fui sozinho na piroga ( canoa). Era grande. Viagem calma. Na volta, viria também sozinho numa grande piroga, quando, na hora da partida, apareceu uma outra piroga, imensa, já cheia de passageiros, sentados no chão da canoa, homens, mulheres, crianças e mais uma carga imensa de cestas enormes com mandioca, folha de aipim, carvão etc. Ela estava indo também para o outro lado do rio, na região do mercado Spirro, perto de nossa igreja. Para não viajar com duas canoas, me colocaram no último lugarzinho que sobrava da canoa que estava partindo. Sentado numa cadeirinha de palha, lá fui eu, com muito medo, naquela imensa canoa, cheia de passageiros e de carga. Viagem lenta, pois era preciso subir o rio. Sobe-se pela margem esquerda, sempre bem perto da costa. Dois remadores: um na frente outro atrás. Vigorosos jovens. O de trás empurra a canoa; o da frente dirige, evitando que a canoa bata nas margens do rio. Enquanto se navega pela costa, é agradável, porque sempre à sombra dos arbustos e árvores. A certa altura da viagem, começam a atravessar o rio. A correnteza é forte e nos arrasta. Os remadores fazem esforço redobrado e ritmado para controlar a embarcação. Num momento de pausa, no remo, o jovem da frente refresca seu rosto na água do rio; lava-se; tira o abundante suor que lhe escorre pela face e sem nenhum constrangimento ou medo toma abundantes goles de água do rio, que não é tão limpo assim. E para surpresa minha, repete a cena quando já estamos bem perto da outra margem, onde a água é bem poluída. Lembrei-me, então, de um fato ocorrido com um velho missionário belga, de 87 anos, que ainda vive, P. Mondry. Ele viajava com o P. Dino Ruaro, no interior da RD do Congo, quando aqui ainda havia algumas estradas. A certa altura, P. Mondry pediu para parar o carro, à beira de um riacho. Desceu, foi ao riacho e bebeu da água suja. P. Dino, atônito, lhe perguntou: - Padre, não tem medo de beber dessa água? Ah! - respondeu o velho missionário - bebi água limpa e me fez mal; bebo da água suja e não me faz mal!
Cansado, mas muito contente, voltei para meu quarto. Mais um dia de missão. Não ganhei nada materialmente, mas senti-me feliz em poder dar algum conforto espiritual e alegria àquela pobre gente!
Mais feliz ainda fiquei quando, hoje, segunda-feira, enquanto estou aqui, em meu escritório, escrevendo essa crônica, recebo a visita do chefe da capela de Muchapa e de um garotinho de lá, perguntando como foi minha viagem de volta. Em geral, eles entram aqui, somente para pedir algo. E os dois vieram perguntar como foi minha viagem de volta! Que bonito!

P. Osnildo Carlos Klann, scj
Kisangani, 17 de novembro de 2008

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Estação das chuvas


Estamos na estação das chuvas. Aqui, como no Norte e Nordeste brasileiros, há apenas duas estações: a estação seca e a estação das chuvas. Kisangani para, quando chove. Os negócios não abrem, porque não há compradores. Os trabalhadores não vão ao trabalho, porque não têm como enfrentar a chuva. O mercado central e as vendas em cima das calçadas desaparecem. A energia elétrica é cortada. Portanto não se pode trabalhar com aparelhos elétricos nem eletrônicos, como por exemplo, fábrica de móveis, serraria, fábrica de bebida.... ( Estou escrevendo essa crônica, em meu laptop com bateria). As crianças não vão á escola, porque não têm guarda-chuva. Com chuva, tudo para aqui.

Para dizer a verdade nua e crua, a RD do Congo é um pais em falência. Certamente as guerras e a corrupção levaram a isso. Não temos estradas. Meios de transporte precaríssimos. Além da falta de estradas, outro setor em falência é a educação. Professores mal pagos; alunos impossibilitados de pagar a “prime” (mensalidade), prédios em lamentável estado de conservação, alunos das escolas publicas sem livros e muitas vezes, sem cadernos; salas de aula, sem quadro negro, sem giz, sem bancos... tudo isso revela o estado de degradação a que chegou a educação nesse país.

Nem vou falar de novo, da saúde, da higiene publica, das moradias, das ruas das cidades...
Com a guerra no leste, os preços dos alimentos e de outros produtos foram para as estrelas. Um saco de cimento, que no leste custa aproximadamente 15 U$ ( quinze dólares), e no pais vizinho, Rwanda, 6 U$ (seis dólares); aqui em Kisangani, custa 50 U$ (cinqüenta dólares). Nós estamos aumentando o centro D. Grison. Como poderemos continuar a construir com esses preços? Um saco de feijâo custa “apenas” 170 U$ (cento e setenta dólares).Deveria ser o alimento dos pobres!!!

E a guerra no leste continua. Noticias diárias dão conta que as populações daquela região vivem ainda o drama dos saques, das mortes, das perseguições, dos tiroteios. Os revolucionários, um reduzido número de militantes, fazem a guerra das guerrilhas. O exército congolês é impotente para deter o avanço dos comandados de Nkunda; a Monuc ( Missão da Onu no Congo) também não consegue proteger toda a população. O grupo Pareco ( Patriotas resistentes congoleses) entra também na guerra para defender a população, mas não resiste igualmente. Enquanto isso, os grandes se reúnem em discussões intermináveis, com vultosos gastos de viagem, hotel, diárias, e não chegam a nenhuma conclusão. Os dois presidentes de Rwanda e da RD do Congo, há dias, se reuniram em Nairobi ( Quênia), para tratar do assunto da guerra; até agora, apesar de ter procurado, todos os dias, noticias da reunião, não encontrei nada. Não sei o que aconteceu nessa reunião; ou se aconteceu algo de importante. Tem-se a impressão que eles não querem acabar com a guerra. Há muitos interesses econômicos atrás de tudo isso.

Domingo ultimo, o Papa, no Angelus do meio-dia, fez um veemente apelo pela paz na RD do Congo, manifestando sua preocupação pelas numerosas vitimas desses sangrentos confrontos, e denunciando as sistemáticas atrocidades cometidas contra a inocente população civil do leste congolês. Segundo o Papa, mais de um milhão e meio de refugiados já tiveram de abandonar suas casas, vivendo agora em situação precaríssima, segundo o testemunho do enviado da Onu, para a manutenção da paz.

A Igreja está seriamente empenhada em ajudar os refugiados,especialmente a Caritas espanhola, Caritas congolesa e a Caritas internacional.
Também as congregações religiosas estão sensibilizadas e desejam colaborar na ajuda humanitária às populações do leste congolês. Em conversa, via skype, com o P. Cláudio Weber, conselheiro geral de nossa Congregação, domingo passado, soube que P. Ornelas, nosso superior geral, ,convocou uma reunião,para essa quarta-feira, com todos os superiores gerais de Roma, que possuem religiosos trabalhando na África, para tratar do trágico problema congolês. É evidente que não poderão terminar com a guerra. Mas vão manifestar e oferecer sua solidariedade ao sofrido povo do leste congolês e chamar, mais uma vez, a atenção dos responsáveis, para desenvolverem reais esforços em busca de uma solução diplomática, estável, para essa guerra.

Que venha a paz para a nossa nação!

Apesar de todos esses problemas, vale a pena estar e trabalhar aqui. Não se pode resolver todos os problemas. Mas ao menos pode-se colocar uma gota d´água na fervura dessa geral situação de sofrimento.

Kisangani, 11 de novembro de2 008
P. Osnildo Carlos Klann, scj

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Trégua no leste congolês

Meus amigos, a situação hoje, dia 2 de novembro, está mais calma no leste congolês. A pressão internacional deteve a marcha de Nkunda. Mas ele está ainda nos arredores da cidade de Goma. Os emissários dos EUA, da União Européia, da ONU, da Grã Bretanha, fizeram apelos e forte pressão pela paz e conseguiram um cessar-fogo, enquanto Alan Doss, representante especial do secretário geral das Nações Unidas, pede às tropas da ONU e à população de Goma para colaborem com a segurança da cidade. Foi decretado, hoje, o toque de recolher.

As autoridades mundiais envolvidas no processo diplomático para a restauração da paz na região, conseguiram convencer os dois presidentes de Rwanda (Kagame) e da RD do Congo (Kabila) para se reunirem e tratarem diretamente do assunto da guerra, pois o conflito envolve diretamente esses dois países, embora Rwanda negue.

Mas, enquanto de um lado, se procura a paz, em outro ponto, mais ao norte de Kivu Norte, um outro grupo revolucionário aterroriza a população com massacres, mortes, violências, pilhagem. É o grupo LRA (siga inglesa: Lord´s Resistance Army). São ugandenses que também invadem o território congolês e atemorizam a população.

Outro grupo perigoso da região são os Mai-Mai. São cangaceiros; bandidos, que matam, roubam, violentam ...
Como veem, não será fácil trazer a paz para esse país.

Kisangani, 2 de novembro de 2008.
P. Osnildo Carlos Klann, scj

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